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Protestos fazem Museu de História Natural de Nova York cancelar evento em homenagem a Bolsonaro

Publicado originalmente em 20 de Abril de 2019

Após o Museu Americano de História Natural decidir cancelar, na segunda-feira, um evento em que a Câmara de Comércio Brasil-EUA homenagearia o presidente brasileiro Jair Bolsonaro com seu prêmio de “Personalidade do Ano”, um segundo importante lugar em Nova York, o Cipriani Hall, recusou-se a receber o evento.

Embora ainda não tenham surgido detalhes sobre a decisão do Cipriani Hall, isso certamente aconteceu pelo forte repúdio dos funcionários e cientistas do Museu de História Natural ao fascista presidente brasileiro, fazendo com que eles organizassem protestos contra a cerimônia, com ameaças de demissões e de um boicote total ao museu caso ele recebesse o evento.

Em seu comunicado anunciando que o evento seria realizado em outro lugar, o museu disse que a decisão foi tomada “em acordo mútuo com a Câmara de Comércio Brasil-EUA”. No entanto, ele permaneceu em silêncio sobre o repúdio dos funcionários e cientistas a Bolsonaro, bem como em relação às razões que o levou a aceitar sediar o evento em homenagem ao presidente brasileiro.

Quando os protestos começaram, o museu afirmou que o evento, que aconteceria no “Hall of Ocean Life”, era “externo, privado” e que sua reserva “foi feita antes que se soubesse quem seria o homenageado.” Ambas as alegações do museu foram recebidas com ceticismo por seus funcionários, tendo um deles dito ao Gothamist: “Seria difícil para mim imaginar que ele [o museu] não está apenas encobrindo isso agora”.

Cientistas e estudantes da Escola de Pós-Graduação Richard Gilder, que é ligada ao museu, reagiram publicando uma carta aberta de protesto, classificando a homenagem a Bolsonaro como uma afronta aos objetivos e valores do museu. Segundo a carta, “Uma das maneiras pelas quais podemos proteger o futuro das populações indígenas, cientistas, cidadãos e os esforços de bioconservação no Brasil é não aceitar que o presidente fascista tenha acesso ao nosso lar institucional coletivo, o que faria com que essas pessoas e esforços fossem ativamente prejudicados e destruídos.”

Tais reações são plenamente justificadas e extremamente significativas, mostrando mais uma vez a crescente oposição social à ascensão da extrema direita, bem como à irracionalidade capitalista em relação às mudanças climáticas, expressa nas poderosas manifestações mundiais deste ano contra a inação dos governos burgueses diante da catástrofe social que pode ser causada por elas.

O governo de Jair Bolsonaro representa a forma mais acabada de tal irracionalidade, tendo nomeado como ministro das Relações Exteriores o chauvinista cristão de extrema direita, Ernesto Araújo, que não apenas nega as mudanças climáticas, como também ataca a ciência climática dizendo que se trata de “uma conspiração marxista”. Enquanto isso, o governo propôs cortar o orçamento da ciência no Brasil pela metade.

Em apenas 100 dias, o governo Bolsonaro já autorizou o uso de dezenas de agrotóxicos, incluindo 12 considerados altamente tóxicos, suspendeu 600 milhões de reais em projetos de recuperação ambiental, nomeou representantes do agronegócio para agências ambientais, como o Serviço Florestal Brasileiro, e realizou um expurgo e censurou duas das principais agências ambientais do país, o Ibama e o ICMBio, cuja equipe remanescente, após dezenas de demissões, só pode falar à imprensa com a autorização do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

Bolsonaro também interveio pessoalmente nas operações de fiscalização do Ibama, a agência encarregada de combater atividades ilegais em áreas protegidas e o tráfico de espécies animais e vegetais protegidas, ordenando a suspensão da prática padrão de destruição de máquinas usadas na extração ilegal de madeira.

Desde sua campanha eleitoral, ele transformou os ambientalistas em um dos principais alvos de seus comícios, classificando-os como corruptos e traiçoeiros, servindo aos “interesses estrangeiros” para coibir atividades ilegais em florestas brasileiras e terras indígenas. Tais ataques já resultaram em um aumento das emboscadas realizadas por mercenários a serviço de magnatas do agronegócio contra camponeses e indígenas brasileiros.

Nos próximos meses, o governo se comprometeu a enviar ao Congresso um projeto de lei que autoriza atividades de mineração e agronegócio em terras indígenas – inclusive por empresas estrangeiras – e um novo sistema de licenças ambientais por “autodeclaração”. Segundo o presidente do Ibama, Eduardo Bim, esse sistema estaria de acordo com a crença de Bolsonaro de que se “deve confiar no cidadão”. Com o objetivo de “acelerar” investimentos, a “autodeclaração” seria um formulário on-line no qual o solicitante de uma licença ambiental, incluindo empresas, se comprometeria a cumprir os requisitos ambientais e, assim, seria autorizado a iniciar seu trabalho, sendo submetido a inspeção somente mais tarde – se isso de fato acontecer – e possivelmente após danos irreparáveis ao meio ambiente.

Enquanto protestos foram convocados na capital Brasília para a próxima semana em reação a esses ataques, Bolsonaro pediu que o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, o general Augusto Heleno, chamasse a Força Nacional para contê-los.

Tais ataques, claramente orientados para aumentar os lucros das empresas brasileiras e estrangeiras, colocam sérias questões. Tanto nos EUA como no Brasil, bem como em todo o mundo, seções do establishment político burguês têm se colocado como opositoras da linguagem fascista grosseira de Bolsonaro, Trump e outros líderes mundiais de extrema direita, sendo, no entanto, responsáveis por sua ascensão.

Está claro agora que os administradores bilionários do Museu de História Natural, que inclui o negador das mudanças climáticas e financista da extrema direita, Rebekah Mercer, se curvaram aos protestos apenas para abafar a crescente oposição social.

Enquanto isso, os políticos burgueses estão trabalhando dia e noite para isolar os crescentes protestos contra a inação dos governos em relação às mudanças climáticas de qualquer oposição mais ampla ao capitalismo. Esse é o objetivo de iniciativas ineficazes, como o “New Deal Verde” nos EUA e o Acordo de Paris, que foram promovidos pelos supostos opositores de Bolsonaro, incluindo o prefeito democrata de Nova York, Bill de Blasio.

Enquanto se distanciam publicamente dos ataques fascistas de Bolsonaro – e Trump –, os ingressos esgotados de US$ 30 mil para o evento cancelado no museu expõem a verdadeira atitude da classe dominante em relação a essas forças, com suas promessas de lucros ainda mais obscenos e riqueza cada vez maior.

Antes de fingir se opor a Bolsonaro em Nova York, essa mesma elite empresarial recebeu de maneira calorosa, no Wilson Center em Washington, DC, o vice-presidente de Bolsonaro, general Hamilton Mourão. Segundo o convite de sua palestra, “Os primeiros 100 dias do governo Bolsonaro foram marcados por uma paralisia política, em grande parte devido a sucessivas crises geradas pelo círculo íntimo do próprio presidente, se não por ele mesmo. Entre o barulho político, o vice-presidente Hamilton Mourão emergiu como a voz da razão e moderação, capaz de prover direção em questões domésticas e de política externa.”

A “razoabilidade” de Mourão deve permitir uma busca contínua e mais segura de lucro, reprimindo os discursos fascistas de Bolsonaro que expõem a elite dominante pelo que ela é. Dias antes, a reputação do general de direita como o “adulto na sala” rendeu-lhe aplausos de pé na “Brazil Conference” do MIT. Essa é uma clara operação para encobrir o papel de Mourão no governo Bolsonaro, uma vez que em 2016 essa mesma conferência de ricos impulsionou a campanha de extrema direita de Bolsonaro ao convidar como principal palestrante seu mentor, o colaborador de Steve Bannon e ideólogo de extrema direita, Olavo de Carvalho.

Da mesma forma, a elite governante global estendeu o tapete vermelho para Bolsonaro em Davos em janeiro, e as autoridades do Chile permaneceram em silêncio depois do presidente brasileiro ter justificado os crimes do ditador fascista Augusto Pinochet antes de sua visita ao país para consolidar o novo bloco pró-imperialista PROSUL.

Já autoridades do governo israelense, que está assumindo um caráter cada vez mais fascista, ficaram em silêncio quando, em visita ao Centro Mundial de Memória do Holocausto, Bolsonaro elevou o revisionismo histórico ao auge da política de estado ao declarar que o nazismo é uma ideologia de esquerda. Apenas duas semanas depois de visitar Israel, Bolsonaro disse em uma conferência de líderes evangélicos no Brasil – invariavelmente retratados como os melhores “amigos” de Israel pelo grupo de extrema direita de Netanyahu – que os crimes do Holocausto poderiam ser “perdoados”.

Para combater o aquecimento global é necessário levar esses fatos com a maior seriedade e denunciar implacavelmente a fingida oposição tanto dos democratas nos EUA quanto do Partido dos Trabalhadores (PT) no Brasil.

Acima de tudo, é necessário voltar-se para a classe trabalhadora, a única força internacional capaz de coordenar as tarefas hercúleas que a humanidade enfrenta.

Também exige uma ruptura definitiva com toda a assim chamada “esquerda” – incluindo os partidos Verdes em todo o mundo –, cuja hostilidade à classe trabalhadora permitiu o surgimento de figuras de extrema direita que demagogicamente prometem que reduzir as regulamentações ambientais, o retorno da indústria de mineração de carvão e a exploração de petróleo desastrosa trarão um pouco de alívio econômico. E, no Brasil, eles buscam colocar os trabalhadores contra as populações indígenas oprimidas.

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