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Centrais sindicais brasileiras defendem reacionária “reforma” da previdência em ato de 1˚ de Maio

Publicado orginalmente em 3 de Maio de 2019

Uma semana depois da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados ter aprovado a admissibilidade da “reforma” da previdência do governo Bolsonaro, presidentes de centrais sindicais brasileiras reuniram-se no centro de São Paulo para o primeiro ato unificado de 1˚ de Maio com o objetivo de defender essa reforma.

Eles estiveram ao lado de representantes da oposição supostamente de “esquerda” a Bolsonaro, principalmente o Partido dos Trabalhadores (PT) e seu defensor da pseudo-esquerda, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).

A reforma da previdência tem sido a questão mais urgente para a elite dominante brasileira desde que a crise econômica mundial atingiu o país com força total em 2013, levando a uma queda de 8% no PIB até 2016 e, desde então, a recuperação econômica mais lenta história.

A amplamente odiada reforma da previdência tem o objetivo de colocar o peso da dívida pública do país nas costas dos trabalhadores, roubando nada menos que 1,3 trilhão de reais de trabalhadores ativos e aposentados ao longo dos próximos 10 anos.

Isso acontecerá através do aumento da idade mínima de aposentadoria para 65 anos, um pouco abaixo da expectativa de vida nos estados brasileiros mais pobres e muito acima da expectativa de vida de 55 anos dos moradores das favelas de São Paulo. A reforma da previdência de Bolsonaro também permite a redução do salário mínimo de aposentadoria para 70% do salário mínimo (hoje, o menor salário de aposentadoria corresponde ao valor do salário mínimo, que é pago a trabalhadores pobres incapazes de pagar a contribuição previdenciária durante sua vida profissional) e estabelece um esquema de capitalização individual operado por fundos de investimento.

O impacto social devastador da reforma fica claro pelo fato de que, para 17 milhões de pessoas, as aposentadorias dos membros mais velhos de suas famílias constituem sua principal fonte de renda, representando mais de 75% dos rendimentos das famílias.

A necessidade de se aprovar a reforma da previdência foi impulsionada nas últimas semanas pela divulgação de novos dados econômicos, que confirmam a recuperação econômica mais lenta da história do país, com a renda per capita ainda 9% menor do que no seu maior nível antes da crise, um crescimento econômico de 1% ao ano desde 2016 e um novo aumento do desemprego para 12,7%, atingindo 13,4 milhões de trabalhadores.

O IBGE revelou que a situação econômica real é ainda pior, com um recorde de 25% da força de trabalho – 28,3 milhões de trabalhadores – desempregada, trabalhando meio-período ou tendo deixado de procurar emprego, que aumentou de 5,6% no último trimestre.

A enorme reestruturação das relações de classe incorporada na reforma da previdência tem sido, ao lado da reaproximação com Washington, o objetivo central da classe dominante brasileira desde a eleição de 2014. Proposta inicialmente pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT), a reforma da previdência estava entre as medidas de austeridade que provocaram uma queda acentuada nos votos do PT nos centros da classe trabalhadora brasileira em 2014 e, posteriormente, tornou grandes setores da classe trabalhadora indiferentes às manobras direitistas que levaram ao seu impeachment em 2016. Com o impeachment da impopular Dilma Rousseff, a classe dominante esperava aprovar a reforma da previdência de seu vice-presidente, Michel Temer, que deixou o cargo no ano passado como o presidente mais impopular desde o fim da ditadura militar brasileira.

A reforma da previdência de Temer foi abandonada diante da possibilidade do presidente sofrer impeachment em 2017 e pela aproximação das eleições de 2018, uma vez que os congressistas temiam que fossem punidos nas urnas por apoiar a medida. O medo foi bem fundamentado: a greve geral de abril de 2017, que foi convocada para liberar a enorme pressão social contra o governo Temer, obteve uma resposta militante de 35 milhões de trabalhadores nas 185 maiores cidades do país, interrompendo a indústria e os transportes em todas as regiões do país.

A popularidade de Bolsonaro, que se deteriorou drasticamente desde que assumiu a presidência, foi o resultado em parte de sua oposição retórica e demagógica à reforma da previdência quando ele era membro da coalizão liderada pelo PT no Congresso.

Diante da situação desse passado recente, o medo de perder o controle de novas greves em massa está no centro das táticas do PT em relação à reforma da previdência, que o partido apoia totalmente. Embora afirme que se opõe ao governo Bolsonaro, o PT vem promovendo freneticamente o vice-presidente e ultradireitista defensor da ditadura militar brasileira, general Hamilton Mourão, como um dedicado nacionalista que se opõe à aproximação de Bolsonaro ao imperialismo estadunidense e especialmente à coordenação do governo brasileiro com Washington na operação de mudança de regime na Venezuela.

Levando adiante uma política igualmente traiçoeira nas discussões sobre a reforma da previdência, o PT tem ajudado a criar, desesperada e obsessivamente, divisões entre Bolsonaro e sua equipe econômica, liderada pelo “Chicago Boy” Paulo Guedes, que servem para confirmar as próprias alegações de Bolsonaro de que ele está sendo “pressionado” a aprovar essa reforma.

Essa postura de Bolsonaro foi atacada de maneira furiosa em um editorial do jornal O Estado de S. Paulo de 27 de abril, depois do presidente brasileiro ter dito que ele esperava aprovar uma reforma com apenas a metade da economia proposta por Guedes. O editorial disse que “o presidente Jair Bolsonaro parece inexplicavelmente inclinado a fazer concessões e descontos antes mesmo que alguém demande, como se ele mesmo não desse muito valor à reforma.”

A cada sinal de pressão da elite capitalista brasileira sobre Bolsonaro, o site porta-voz do PT, Brasil247, reage com uma notícia inventada para canalizar a insatisfação com o governo por trás de Guedes. Dois dias depois da posse de Bolsonaro, o Brasil247 publicou uma matéria com o título: “Bolsonaro trai mercado: a reforma da previdência é mais light que a de Temer”.

Essa política culminou no reacionário espetáculo do 1˚ de Maio em São Paulo, onde a maior central sindical do país, a CUT, que é controlada pelo PT, decidiu realizar pela primeira vez um ato unificado com a UGT e a Força Sindical, a segunda e a terceira maiores centrais sindicais brasileiras. Durante décadas, a CUT criticou tanto a Força quanto a UGT por serem centrais sindicais patronais.

A própria CUT já havia mostrado total covardia quando seu presidente, Vagner Freitas, se desculpou em dezembro passado depois de ter tido que não reconhecia Bolsonaro como presidente da república, depois quando enviou, junto com as outras centrais sindicais brasileiras, em janeiro, uma carta em que se dirigia “respeitosamente” ao presidente Bolsonaro e pedia diálogo com o novo governo e, finalmente, em fevereiro, quando procurou se aproximar do vice-presidente Mourão. O presidente da UGT, Ricardo Patah, chegou a realizar na última segunda-feira uma reunião com Bolsonaro, prometendo “construir [uma] ponte” entre as outras centrais e o governo. No ato, ele se opôs publicamente a uma greve geral anunciada para 14 de junho.

Por sua vez, o ex-presidente da Força Sindical e deputado Paulo Pereira da Silva declarou que seu partido e todo o Centrão, que possui 207 dos 513 deputados da Câmara, estavam buscando uma reforma da previdência com uma economia de 500 bilhões de reais para os próximos 10 anos. Ele justificou a proposta afirmando que isso seria o suficiente para enxugar o orçamento e “não garantir a reeleição de Bolsonaro”. Em outras palavras, longe de se opor ao massacre dos direitos dos trabalhadores, os partidos do Centrão acreditam que podem chantagear o governo.

Não há dúvida de que Bolsonaro se envolverá em tais negociações, e que o PT está apenas esperando que ofertas semelhantes contribuam com sua parcela de votos para a aprovação da reforma.

O governo já colocou sobre a mesa a possibilidade de aumentar em 65% as emendas parlamentares para os deputados que votarem a favor da reforma da previdência e disse que negociaria 2.000 cargos de baixo escalão do governo federal com os partidos que fizerem o mesmo.

A data da greve geral de 14 de junho está marcada para coincidir com o fim das discussões sobre a reforma da previdência na comissão especial e sua votação no plenário da Câmara. Isso dará ao governo uma trégua de um mês e meio para as negociações com os deputados sobre alguns pontos da reforma. Esse tempo será suficiente à burocracia sindical para desmobilizar a greve geral, como já fez inúmeras vezes desde a greve de abril de 2017 que horrorizou o PT e as centrais sindicais.

Esses desenvolvimentos têm implicações explosivas. Com sua popularidade já em queda livre, o fascista Bolsonaro está mergulhando nas políticas de austeridade e nas práticas de corrupção que desacreditaram todo o sistema político brasileiro – primeiro e principalmente o PT, que já em 2003 recorreu à compra de votos para aprovar sua reforma da previdência.

Para combater os crescentes ataques à classe trabalhadora, é necessário expor incansavelmente a oposição fingida do PT e os encobrimentos dos grupos da pseudo-esquerda a sua volta que foram copatrocinadores do ato de 1˚ de Maio. Isso inclui em primeiro lugar a miríade de organizações pablistas e morenistas no PSOL, que levou a Intersindical ao ato, o morenista PSTU, que compartilha com o PSOL o controle da CSP-Conlutas, e o lambertista Partido da Causa Operária (PCO), que fornece uma cobertura à esquerda à própria CUT e promove a ilusão de que o ex-presidente petista, Luiz Inácio Lula da Silva, se opõe de alguma forma às políticas reacionárias pró-capitalistas de seu próprio partido.

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