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Manifestantes falam sobre os ataques de Bolsonaro à educação durante protesto em São Paulo

Publicado originalmente em 21 de Maio de 2019

Em 15 de maio, cerca de um milhão de pessoas saíram às ruas em mais de 200 cidades em todo o Brasil na maior manifestação nos últimos anos, a primeira nacional contra o governo do presidente fascista Jair Bolsonaro.

Manifestação de 15 de maio em São Paulo

O que era para ser outra isolada e pequena greve nacional de professores convocada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE), filiada à CUT e controlada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), contra a “reforma” da previdência do governo Bolsonaro, transformou-se em uma manifestação em massa quando estudantes de todo o Brasil mobilizaram-se espontaneamente contra o último ataque do governo à educação – um corte de 30% para instituições federais de ensino. Essa erupção espontânea da juventude revelou a incapacidade e a falta de vontade do PT e da burocracia sindical para fornecer qualquer saída para a imensa raiva social que está se acumulando contra o governo Bolsonaro.

Desde as primeiras horas de 15 de maio, estudantes secundaristas de escolas públicas e privadas já protestavam e bloqueavam ruas de São Paulo. À tarde, mais de 100 mil pessoas foram à Avenida Paulista, principalmente estudantes de universidades públicas e professores de escolas públicas municipais e estaduais de São Paulo, além de alunos e professores de algumas universidades particulares, como a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC–SP).

Leo, um estudante do ensino médio de uma das escolas particulares cujos professores paralisaram em 15 de maio, disse que ele e seus amigos estão “aqui em defesa dos professores, mostrando nosso apoio”, pois “a estrutura mesma de toda a educação está sendo atacada com essas propostas do governo, que vem ocorrendo há muito tempo.”

Seu amigo Arthur completou dizendo que “desde o governo petista existem essas ameaças contra a educação.”

Leo e Arthur ao centro

Eles também denunciaram o acordo traiçoeiro assinado com os donos de escolas particulares no ano passado pelo SINPRO, o sindicato de professores de escolas particulares, segundo o qual o sindicato garantiu o pagamento de horas extras e outros direitos por apenas um ano, em vez do contrato de cinco anos exigido pelos professores.

Entre as recentes mudanças que “atacam toda a estrutura da educação” está a reforma pró-empresarial do ensino médio, que foi aprovada pelo Congresso Brasileiro em 2017 e começará a ser implementada no ano que vem. Juntamente com o projeto de lei aprovado em 2016 que congela os gastos sociais nos próximos 20 anos, e que cortará 1 trilhão de reais da educação nesse período, a reforma do ensino médio é a maior mudança na educação brasileira nos últimos 25 anos, e permitirá a implementação de escolas “charter” privadas de tempo integral.

Em relação aos cortes anunciados pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, no final de abril, que chegam a 40% para a educação básica, Leo disse que isso o fez pensar sobre as políticas de extrema direita do governo. Segundo ele, “Pode parecer um pouco radical dizer isso, mas as pessoas falam muito sobre como isso se relaciona com o anti-intelectualismo, o que não significa que seja simplesmente um projeto para deixar as pessoas burras, mas o desinvestimento é o resultado de um processo histórico.”

O que Leo chama de “anti-intelectualismo” – a promoção oficial do revisionismo histórico em relação à ditadura militar e ao nazismo no Brasil e os ataques às ciências climáticas, juntamente com os cortes orçamentários – é uma das principais expressões dos ataques da extrema direita à educação diante da crescente radicalização política dos estudantes nos últimos anos.

O ministério da educação tem estado no epicentro desse processo, com o ex-ministro da Educação, Ricardo Vélez, que antecedeu Weintraub, chegando a dizer que o ministério faria uma revisão dos livros didáticos que contam a história do golpe de 1964 e da ditadura militar no Brasil.

Essa tem sido a reação da burguesia contra a guinada à esquerda da juventude brasileira, que desde 2015 tem sido o elemento mais combativo na luta contra o assalto à educação no país. Nesse ano, em São Paulo, 200 escolas foram ocupadas por estudantes do ensino médio contra um plano de reorganização escolar do governo estadual, que foi seguida pela ocupação de mais de 1.000 universidades e escolas no Brasil em 2016 contra a reforma do ensino médio e a lei que congela os gastos sociais nos próximos 20 anos.

Uma das primeiras respostas a essa onda de ocupações foi um enorme ataque a estudantes e professores através dos projetos de lei do movimento “Escola sem Partido”, que alega que professores realizam “doutrinação ideológica marxista” em sala de aula ao invés de ensinarem os alunos a “ler, escrever e fazer conta”, de acordo com um recente tuite de Bolsonaro.

Apesar de claramente inconstitucional por violar a liberdade de expressão e de ensino, o projeto de lei do “Escola sem Partido” já foi apresentado em dezenas de Câmaras Municipais, Assembleias Estaduais e no Congresso Nacional. Os projetos de lei proíbem e criminalizam “a prática de doutrinação política e ideológica, bem como a veiculação de conteúdos ou a realização de atividades que possam estar em conflito com as convicções religiosas ou morais dos pais ou responsáveis pelos estudantes.”

Os primeiros projetos de lei do “Escola sem Partido” foram apresentados em 2014 pelos filhos de Bolsonaro, Carlos e Flávio, no Rio de Janeiro. Depois, em 2016, outro filho de Bolsonaro, o deputado federal Eduardo, que possui estreito contato com Steve Bannon e organizações fascistas internacionais, apresentou um projeto de lei na Câmara dos Deputados que, equiparando o comunismo e o nazismo, criminaliza a “apologia ao comunismo”.

Desde que assumiu o governo brasileiro, os ataques de Bolsonaro e seus representantes contra a educação pública incluem um decreto que regulamenta a educação domiciliar (ou “homeschooling”) e a proposta de “descentralizar investimento em faculdades de filosofia e sociologia”, além dos recentes cortes anunciados. Represada até então, parte da raiva social a esses ataques foi liberada na manifestação do dia 15 de maio. No entanto, muitos jovens expressaram sua desconfiança em relação ao fato das mobilizações terem acontecido sob o controle dos sindicatos.

Weber e Toledo, à direita, com seus amigos

Weber, um ex-estudante de sociologia que foi à manifestação com seus amigos da região industrial do ABC, disse que porque “a educação tem a capacidade de mobilizar muita gente, até as centrais sindicais tiveram que se posicionar.” Segundo ele, as centrais sindicais, como a CUT, não querem levar a luta adiante “porque são fechadas com os patrões. Além disso, ao invés de serem uma ferramenta de emancipação da classe trabalhadora, [os sindicatos] são um instrumento de controle.”

Segundo ele, foi por isso que “faltou no ato ... a denúncia das dívidas dos bancos, porque é isso que faz o governo cortar da saúde, da educação, da previdência ... eles querem tirar dinheiro da previdência para dar para os bancos.” Weber se referia aos relatórios do Congresso mostrando que o Estado brasileiro perdoou bilhões de reais em contribuições não pagas ao sistema previdenciário devido ao resgate de empresas. Relatórios oficiais estimam que o valor total desses resgates é de 480 bilhões de reais, mais de um terço da soma que o governo pretende roubar dos trabalhadores em 10 anos com a reforma da previdência.

Seu amigo Toledo explicou que “a partir do Estado Novo [de Getúlio Vargas, que durou de 1937 a 1945], as centrais sindicais só se tornam uma central sindical se conseguem estar assinadas e fechadas com o estado”, dando origem ao “sindicalismo oficial, pelego, como a CUT, a Força Sindical”, hoje em dia.

Uma das maneiras que os sindicatos têm estado atrelados ao estado brasileiro é através do imposto sindical, instituído por Getúlio Vargas em 1940 com o objetivo controlar as organizações operárias e reduzir as tensões entre as classes sociais. Em 2017, com a reforma trabalhista do governo Temer, o imposto sindical deixou de ser obrigatório, o que fez com que a arrecadação das maiores centrais sindicais brasileiras colapsasse.

Segundo reportagem de O Estado de S. Paulo, as três maiores centrais sindicais no Brasil – CUT, Força Sindical e UGT – deixaram de arrecadar 100 milhões de reais em 2018. Para a Força Sindical, isso representou uma perda de 92% de sua receita.

Em março, o governo Bolsonaro impediu através de uma medida provisória que o imposto sindical fosse descontado diretamente da folha de pagamento, o que dificultou ainda mais a situação financeira das centrais sindicais. Porém, no Congresso Nacional, desde 5 de maio, deputados do Centrão e de outros partidos, incluindo o PT e o PCdoB, liderados pelo ex-presidente da Força Sindical, Paulinho da Força, estão tentando obstruir a regulamentação da medida provisória, que vence em 28 de junho.

Segundo o jornal Folha de S. Paulo, “as principais centrais ... pressionam seus parlamentares a barganhar um acordo com o governo em troca da reforma da previdência”. Foi isso que o presidente da UGT, Ricardo Patah, começou a fazer quando se reuniu com Bolsonaro em 29 de abril, dois dias antes de se juntar a outros lideres sindicais da Força Sindical e da CUT no ato unificado de 1˚ de Maio. Além de Patah ter se oposto à greve geral convocada para o dia 14 de junho, ele e Paulinho da Força defenderam a reforma da previdência de Bolsonaro.

Toledo ainda disse ao WSWS: “porque estão fechadas com o estado e ganhando com a burguesia, as centrais sindicais não conseguem falar de socialismo.”

Seu amigo Weber foi ainda mais longe, dizendo: “No capitalismo, sempre os direitos estarão ameaçados. Para superar isso, pra gente não correr mais riscos, a gente precisa construir a sociedade socialista, um coisa que as centrais sindicais não falam.” Ele concluiu: “elas [as centrais sindicais] só querem reformar o sistema, não querem acabar com o sistema.”

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