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Sindicatos brasileiros promovem chauvinismo “verde e amarelo” em greve da educação

Publicado originalmente em 9 de outubro de 2019

Os estudantes brasileiros retornaram às ruas em pelo menos onze estados para uma greve geral nas universidades federais e escolas em 2 e 3 de outubro. Segundo os organizadores, 20 mil pessoas participaram das manifestações no Rio de Janeiro, 5 mil em São Paulo e algumas centenas em outras capitais estaduais.

Essa foi a quarta grande mobilização de estudantes desde maio, quando um milhão de pessoassaíram às ruas de 170 cidades em manifestações contra os cortes na educação. Inicialmente convocadas pelos sindicatos de professores por melhores salários e contra a odiada reforma da previdência que estava sendo discutida na Câmara dos Deputados, as manifestações de maio levaram espontaneamente centenas de milhares de estudantes da educação básica e superior às ruas do país.

Manifestação na Avenida Paulista, em São Paulo

A mobilização em massa de maio aterrorizou não apenas o governo, mas também a oposição burguesa, liderada pelo Partido dos Trabalhadores (PT), os sindicatos e a pseudo-esquerda, encabeçada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Desde então, essas forças políticas têm feito de tudo para isolar as manifestações da juventude ou subordiná-las a uma aliança entre o PT e setores da antiga oposição de direita insatisfeitos com o presidente fascista Jair Bolsonaro, principalmente o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB).

A queda no número de manifestantes desde maio é sinal desses desesperados esforços e contrasta enormemente com a agitação cada vez maior na juventude e entre os trabalhadores. No início de setembro, 120 mil trabalhadores dos Correios entraram em greve, que foram seguidos pelos trabalhadores da Embraer. Estudantes da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) estão em greve desde 10 de setembro contra o corte de verbas do governo federal.

Enquanto a greve dos Correios foi encerrada pelo sindicato para o Tribunal Superior do Trabalho julgar o dissídio coletivo da categoria, a Polícia da Aeronáutica e a Tropa de Choque da Polícia Militar foram mobilizadas e intimidaram os trabalhadores da Embraer em greve, liberando a entrada da fábrica para os trabalhadores do setor administrativo da empresa. A Embraer possui uma divisão militar envolvida na produção de jatos de treinamento para a Força Aérea dos EUA, entre outras.

Ao mesmo tempo, longe de estarem resolvidos, os problemas que levaram os estudantes às ruas em maio apenas pioraram, e as manifestações espontâneas têm se espalhado pelo país. Os estudantes têm se mobilizado não apenas contra bloqueios e cortes cada vez maiores, mas também contra as intromissões políticas nas eleições de novos reitores em instituições federais e a censura de livros, filmes e peças de teatro em escolas, feiras de livros e centros culturais realizada por grupos religiosos. Também há um repúdio cada vez maior ao crescimento da violência policial, uma vez que um quinto dos assassinatos em São Paulo e no Rio de Janeiro são cometidos pela polícia militar.

As manifestações de maio foram provocadas por um corte de 30% no orçamento federal para a educação e ameaças do ministro da Educação, Abraham Weintraub, de que cortaria o financiamento para as universidades que permitissem a “balbúrdia” nos seus campi. Entre as ações de “balbúrdia”, ele citou eventos públicos em apoio à reforma agrária e faixas antifascistas estendidas durante as eleições de 2018.

Agora, o governo anunciou um corte de 25% no orçamento da educação para o ano que vem e um corte de 50% nos fundos destinados à CAPES, agência do governo responsável pelo financiamento de bolsas e projetos para 215 mil estudantes de pós-graduação e pesquisadores, o que fará com que milhares deles não tenham seus contratos renovados. Neste ano, o governo tem atrasado o pagamento de bolsas de outra agência de fomento à pesquisa, o CNPq, e anunciou que poderá suspender suas 84 mil bolsas por falta de dinheiro.

As 63 universidades federais do Brasil, que contam com 1,2 milhão de estudantes, estão com as contas de gás e eletricidade atrasadas e têm reduzido horas de aula, de trabalho nos laboratórios e até nos restaurantes universitários. Na UFSC, a reitoria estuda reduzir em 75% o número de refeições no restaurante universitário, passando a atender apenas os estudantes com isenção por questão socioeconômica.

Além disso, através do ministro Weintraub – que parafraseou os nazistas, dizendo que “os comunistas são o topo do país. Eles são o topo das organizações financeiras; eles são os donos dos jornais; eles são os donos das grandes empresas. Eles são os donos dos monopólios.” –, Bolsonaro assinou um decreto em maio que proíbe os reitores de nomearem vice-reitores e outros cargos de confiança, como pró-reitores e diretores de centros de ensino. Essas nomeações passaram a ser realizadas diretamente pelo governo e pelas agências de inteligência. Ele também interviu nas eleições de reitores em pelo menos seis instituições federais, nomeando candidatos menos votados que considerou aliados de direita, e, em pelo menos dois casos, nomeando assessores de gabinete sem qualquer conexão com as instituições.

Outro alvo dos manifestantes foi o Future-se. O programa do governo federal está sendo discutido na Câmara de Deputados e permite a contratação de professores e funcionários sem concurso público, facilitando assim demissões e reduções de salários, assim como a criação de um novo fundo patrimonial para as universidades. Esse fundo prepararia o caminho para a completa privatização de universidades ao facilitar o financiamento privado da pesquisa e ao permitir que organizações sociais administrem as universidades longe do controle das autoridades universitárias eleitas.

Relatos de funcionários da Caixa Ecônomica Federal ao jornal Folha de S. Paulo também mostraram que o banco estatal ordenou que a avaliação de projetos culturais realizados em seus sete centros culturais levasse em consideração o posicionamento político dos artistas. Processos de censura semelhantes estão sendo implementados pelo Banco do Brasil – o maior banco do país –, a Petrobrás, a Agência Nacional do Cinema (Ancine) e incontáveis instituições estaduais e municipais espalhadas pelo país. Cada uma dessas medidas provocou protestos imediatos da juventude.

No mesmo dia em que ocorreram as últimas manifestações da educação, o Senado estava realizando o primeiro turno da votação da reforma da previdência, que já foi aprovada na Câmara e, provavelmente, será promulgada na semana que vem. A reação dos senadores do PT foi, no melhor dos casos, muda. O portal de notícias UOL citou o senador do PT de Sergipe, Rogério Carvalho, que declarou que a oposição não obstruiria a votação da reforma se o governo garantisse para estados e munícios as receitas do excedente da cessão onerosa do pré-sal.

A oposição do PT tem acompanhado a guinada à direita do governo Bolsonaro. Ela tem isolado a luta dos estudantes de universidades federais das questões mais amplas para evitar a explosão da oposição social ao governo como vista em maio, quando os manifestantes dos estados controlados pelo PT atacaram abertamente os governadores do partido por repetirem a política do governo federal de austeridade e violência policial.

Além disso, nos últimos meses, o PT tem apresentado as políticas de Bolsonaro como uma ameaça ao capitalismo brasileiro, ao mesmo tempo que tem promovido o capitalismo “verde” e o imperialismo dos “direitos humanos” ao elogiar ameaças de autoridades da União Europeia de realizar sanções econômicas contra o Brasil.

As manifestações contra os cortes na educação estão sendo subordinadas aos objetivos chauvinistas de defender as empresas brasileiras e a “vantagem tecnológica” em setores como a extração de petróleo, agricultura e até mesmo a produção de armas.

Os sindicatos destacaram o fato de que as manifestações da greve da educação de dois dias coincidiram com o aniversário de 66 anos da Petrobrás, criada pelo ícone da política nacionalista burguesa no Brasil, o ex-presidente Getúlio Vargas. O governo autoritário de Vargas criou a empresa nacional depois de uma campanha em massa apoiada pelos sindicatos controlados pelo seu Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e o Partido Comunista Brasileiro (PCB).

Pouco antes das manifestações, o senador do PT, Jean Paul Prates, exaltou as forças armadas, acima de tudo, pelo seu papel na fundação da Petrobrás. Enquanto isso, o PT utilizou notícias de cortes de suprimentos para os quartéis para promover o partido como o verdadeiro amigo dos militares, relembrando que o governo do PT permitiu que os militares começassem a construir o submarino nuclear para defender as plataformas de petróleo na costa brasileira.

A tentativa geral foi de retratar a defesa das universidades federais e escolas, que são alvo das brutais políticas de austeridade e intromissões políticas do governo Bolsonaro, como parte de uma campanha chauvinista mais ampla pela “soberania nacional”. Essa campanha teve como público-alvo dois grupos: os opositores de Bolsonaro da direita tradicional, que estão preocupados com a possibilidade de que suas políticas prejudiquem os interesses empresariais, e os militares, que foram alertados de que os cortes de Bolsonaro estão minando a “segurança nacional” e ameaçando a indústria de armas brasileira.

A partir dessa perspectiva reacionária, a União Nacional dos Estudantes (UNE), controlada há décadas pela ala maoísta do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), fez um chamado pelo uso de bandeiras verdes e amarelas nas manifestações da greve da educação, levando os manifestantes a realizarem uma demonstração patriótica enquanto disputavam o apoio das forças armadas.

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