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General do Exército assume Casa Civil do governo Bolsonaro

Publicado originalmente em 21 de fevereiro de 2020

Na terça-feira, 18 de fevereiro, o presidente fascista brasileiro Jair Bolsonaro empossou o general do Exército Walter Braga Netto no Ministério da Casa Civil. Braga Netto comandava, até então, o Estado-Maior do Exército, o segundo posto mais alto da instituição. Com sua posse, Bolsonaro passa a estar literalmente cercado de militares, que lideram todos os ministérios com gabinetes na sede do governo junto ao presidente.

General Braga Netto e Bolsonaro na cerimônia de posse

Braga Netto entra no lugar de Onyx Lorenzoni, membro do partido de extrema direita Democratas (DEM), que esteve à frente do ministério desde o início do governo Bolsonaro. Esta é a primeira vez desde a ditadura militar, que governou o Brasil com mão de ferro entre 1964 e 1985, que um militar ocupa o cargo de ministro-chefe da Casa Civil, o posto político mais alto do governo.

O general Braga Netto ganhou notoriedade na vida política brasileira após liderar, em 2018, a intervenção federal do exército no estado do Rio de Janeiro durante a presidência de Michel Temer. Ao longo de 10 meses, Braga Netto assumiu o comando das forças policiais do estado do Rio de Janeiro junto a forças do exército destacadas para uso interno contra a população civil.

Imposta sob a alegação de uma crise de segurança generalizada no estado, a intervenção federal no Rio de Janeiro resultou na elevação a novos patamares da violência já endêmica, dirigida especificamente contra a população mais pobre. Em relação ao ano anterior, o período da intervenção registrou um aumento de quase 40% nas mortes cometidas por policiais. Nas favelas, os bairros miseráveis da classe trabalhadora, explodiram os relatos de barbaridades típicas dos crimes de guerra: soldados invadindo casas, roubando e quebrando pertences, estuprando mulheres e espancando trabalhadores.

Walter Braga Netto (Crédito: Wikipedia Commons)

Comentando sobre a operação assassina que comandava, o agora ministro-chefe da Casa Civil declarou: “o Rio de Janeiro é um laboratório para o Brasil”. Essa declaração se alinha diretamente às diretrizes de Bolsonaro, que recentemente buscou ampliar as possibilidades de utilização da intervenção militar em território nacional, dando aos soldados liberdade para matar. O presidente justificou a urgência dessas medidas com base na iminência de protestos massivos da classe trabalhadora, similares aos que ocorreram recentemente no Chile.

A participação dos militares na vida política nacional, à frente de postos no governo, tem crescido desde o impeachment da presidente Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores (PT), em 2016, que exacerbou as divisões internas da burguesia brasileira.

Durante a gestão do presidente interino Michel Temer, generais foram nomeados para o Ministério da Defesa e o Gabinete de Segurança Institucional – responsável pela inteligência do governo –, o que foi considerado uma perigosa ruptura com a tradição estabelecida desde o fim da ditadura militar.

Com Bolsonaro, um capitão do Exército aposentado, e seu vice-presidente, Hamilton Mourão, um general da reserva, os militares agora ocupam 9 dos 22 ministérios – incluindo todos aqueles com gabinetes no Palácio do Planalto – e estão presentes em praticamente todos os ministérios. Um artigo da Deutsche Welle noticiou que o atual governo incorporou 2.500 militares de alto escalão. Em 2019, quase um terço de todos os investimentos estatais foram destinados aos militares, um aumento de 89% em apenas três anos. A maior parte deles, segundo o artigo, foi destinada a “empresas estatais supérfluas, que servem principalmente como cabides de emprego”.

Os principais jornais brasileiros interpretaram a reconfiguração ministerial de Bolsonaro desta semana como um fortalecimento da ala militar à custa da assim chamada ala “ideológica” do governo. Essa última é constituída por um grupo de políticos ligados ao ideólogo de extrema-direita Olavo de Carvalho, que tem como objetivo promover uma cruzada contra o que chama de “marxismo cultural”. Olavo foi responsável por indicar o atual Ministro da Educação, Abraham Weintraub, e era tido como um mestre pelo Secretário de Cultura Roberto Alvim, que foi demitido após plagiar o ministro da propaganda nazista Joseph Goebbels em um discurso exigindo que a arte brasileira se subordinasse ao nacionalismo e à religião.

Contudo, em entrevista a O Globo, Olavo de Carvalho respondeu de forma entusiasmada sobre as mudanças no governo. Ele comparou o Brasil com os Estados Unidos – o país onde reside – afirmando que “o Exército brasileiro, ao contrário do americano, não tem presença na sociedade. Eles vivem encostadinhos no canto deles e viram pessoas tímidas”. Sua conclusão é inequívoca: “Agora os militares estão presentes, estão começando a participar da vida social. Precisa trazer mais. Precisa ter militar pra tudo quanto é lado”.

A presença crescente dos militares na política brasileira não tem sido alvo de críticas dos partidos que se consideram oposição ao governo Bolsonaro, em especial o Partido dos Trabalhadores. Pelo contrário. Há algum tempo, políticos do PT e os meios de comunicação dominados pelo partido, como o Brasil 247, têm apelado aos militares e apresentado o vice-presidente, o general Mourão, como um defensor dos interesses nacionais e uma alternativa política progressista a Bolsonaro.

A oposição a Bolsonaro articulada pelo PT, acompanhado do pseudoesquerdista Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), possui um caráter inteiramente oportunista e não apresenta nenhuma resistência às medidas mais reacionárias avançadas pelo governo. Ambos os partidos apoiaram a aprovação do draconiano pacote anticrime de Bolsonaro e, nos estados que governa, o PT implementou as políticas de ataque à previdência de professores e servidores públicos, reprimindo protestos de trabalhadores com a polícia.

Diante das declarações e ações mais ferozes de Bolsonaro, esses partidos apelam, invariavelmente, ao Estado para disciplinar o comportamento “excepcional” do presidente, que qualificam como gestor incompetente e um “presidente miliciano”, o acusando de associação a esquadrões da morte e ao crime organizado do Rio de Janeiro.

General Braga Netto e Bolsonaro (centro) na cerimônia de posse

Essa última acusação voltou à tona após Adriano Nóbrega, um ex-capitão da polícia militar acusado de comandar uma milícia no Rio de Janeiro, ter sido morto pela polícia na Bahia – onde estava foragido – no dia 9 de fevereiro. Adriano possuía uma série de conexões com a família Bolsonaro, sobretudo com o filho do presidente, Flávio Bolsonaro. Quando deputado estadual do Rio de Janeiro, em 2005, Flávio condecorou o capitão Adriano, que era conhecido por sua violência durante as operações em favelas. Posteriormente, o deputado nomeou a mãe e a ex-esposa de Adriano como assessoras de seu gabinete, o que esta sendo investigado como parte de um esquema de corrupção.

As circunstâncias da morte de Adriano, assim como a possibilidade de possuir informações comprometedoras sobre a família Bolsonaro, levantaram suspeitas de que o caso seria uma “queima de arquivo”. Tentando se livrar do peso das suspeitas que recaíram sobre si, Bolsonaro voltou as acusações, sem nenhum fundamento, ao PT: “Quem é o responsável pela morte do capitão Adriano? Foi a [Polícia Militar] da Bahia, do PT. Precisa dizer mais alguma coisa?”

O PT respondeu ao presidente por meio de uma articulação de 20 governadores, uma espécie de “frente ampla” de políticos burgueses contra Bolsonaro. Essa frente inclui políticos notórios da extrema direita, como João Dória, que governa São Paulo pelo Partido Social Democrata Brasileiro (PSDB), e Wilson Witzel, que governa o Rio de Janeiro pelo Partido Social Cristão (PSC), ambos eleitos como apoiadores de Bolsonaro. A frente de governadores publicou uma carta censurando o presidente por “atribuir fatos graves à conduta das polícias e seus governadores”.

Os acontecimentos revelam, repetidamente, que a alternativa a Bolsonaro oferecida pelo PT e seus seguidores da pseudoesquerda possui um caráter profundamente reacionário. Ela tem suas raízes no terreno podre da política burguesa, se alimenta das disputas entre suas frações e se repousa pesadamente sobre os militares. Essa orientação só pode produzir resultados monstruosos, como o próprio fascista Jair Bolsonaro.

O fato de Bolsonaro ocupar a presidência é uma expressão da aguda guinada à direita da classe dominante brasileira e mundial. Esse movimento não se origina no plano ideológico, mas nas preocupações absolutamente materiais da burguesia com a escalada global da luta de classes. A única forma possível de enfrentar a ameaça do fascismo e da ditadura é a mobilização internacional da classe trabalhadora, baseada em uma independência política intransigente e na luta por um programa internacionalista e socialista.

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