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Petição #ZeroCovid: a campanha por um lockdown na Europa requer uma perspectiva socialista

Publicado originalmente em 22 de janeiro.

A petição “#ZeroCovid: por um lockdown europeu em solidariedade” obteve, em poucos dias, seu objetivo inicial de 75.000 assinaturas e agora caminha para 100.000. O grande apoio expressa a crescente oposição à política oficial do governo que coloca os lucros das grandes empresas acima das vidas humanas.

A petição se baseia no apelo de várias centenas de renomados cientistas para a contenção consistente da pandemia da COVID-19 na Europa, publicado em dezembro na revista médica The Lancet, e o complementa com propostas para amortecer as consequências sociais.

Caixões com corpos de vítimas do coronavírus na funerária de Collserola, em Barcelona, Espanha. (Foto: Emilio Morenatti/AP)

O objetivo de “reduzir as infecções a zero” está no cerne da petição. A estratégia para controlar a pandemia (“achatar a curva”) falhou, diz a explicação. “Ela tem restringido a vida de forma permanente e trazido ainda milhões de infecções e dezenas de milhares de mortes. Agora precisamos de uma mudança radical de estratégia: não uma continuidade controlada da pandemia, mas o seu fim”.

Para isso, “todos os países europeus precisam agir rapidamente e em paralelo”. O que é necessário é um fechamento consistente por várias semanas: “As medidas não terão eficácia se apenas se concentrarem no lazer e excluírem o trabalho”, diz a petição. “Temos que fechar os setores da economia que não são urgentemente necessários para a sociedade. Fábricas, escritórios, empresas, escolas, canteiros de obras, devem ser fechados e a obrigação de trabalhar deve ser suspensa.”

Para garantir segurança financeira às pessoas que ficarem em casa, a petição pede “um pacote de ajuda integral para todos”. Deve ser dado apoio especial às “pessoas de baixa renda, pessoas que vivem em condições de aglomeração, em um ambiente violento ou pessoas sem teto”. O alojamento coletivo deve ser dissolvido; os refugiados devem ser abrigados individualmente; as pessoas que prestam muitos cuidados e trabalhos de assistência durante o bloqueio devem ser substituídas pela organização comunitária; e as crianças devem ter aulas on-line.

A petição também exige uma expansão imediata e sustentável de todo o setor de saúde e a revogação das privatizações e dos fechamentos anteriores. As vacinas devem ser “retiradas da produção privada com fins lucrativos”. As medidas serão financiadas pela “introdução de um imposto europeu solidário à Covid sobre as grandes fortunas, lucros de empresas, transações financeiras e rendimentos mais elevados”.

A petição foi apresentada por cerca de 400 signatários iniciais, incluindo cientistas, médicos, profissionais da saúde, jornalistas e artistas.

A petição não contém nenhuma proposta sobre como realizar as exigências feitas. Ela é dirigida aos governos da Alemanha, Suíça e Áustria, assim como aos “tomadores de decisão europeus” e pode ser assinada por qualquer pessoa na plataforma de campanha Campact.

Entretanto, nem esses governos nem a União Europeia estão dispostos a sequer começar a atender às exigências da petição. Foi só no dia 19 de janeiro que a reunião entre líderes estaduais e federais na Chancelaria de Merkel decidiu prorrogar as medidas anteriores, completamente insuficientes, até meados de fevereiro. A reunião rejeitou categoricamente o fechamento de empresas não essenciais, uma obrigatoriedade do home office e um fechamento completo das escolas, embora as taxas de infecção continuem altas e mais de 1.000 pessoas morram todos os dias na Alemanha pela COVID-19.

A razão para esta adesão a uma política de imunidade de rebanho maquiada não é a falta de conhecimento. A chanceler e os chefes dos governos estaduais sabem muito bem que o vírus está se espalhando rapidamente nos locais de trabalho, escolas, creches e nos transportes públicos.

Por exemplo, o estudo mais abrangente até hoje sobre a disseminação do vírus, conduzido pelas universidades americanas de Princeton, Johns Hopkins e UC Berkeley com mais de meio milhão de pessoas na Índia, concluiu já no final de setembro “que as crianças e adultos jovens, que respondem por um terço dos casos de COVID, são particularmente importantes para a transmissão do vírus nas populações estudadas”.

A pandemia, como vem apontando o World Socialist Web Site há algum tempo, não é uma crise puramente médica. A natureza reacionária do capitalismo mundial – a busca pelo lucro que ignora o custo social, o acúmulo de bilhões em riqueza por uns poucos e sua indiferença desumana pelas vidas e bem-estar da população mundial – fez com que a pandemia evoluísse para uma catástrofe social global.

As demandas levantadas pela petição só podem ser realizadas com base em um programa socialista contra a propriedade privada capitalista, o que todos os partidos representados nos governos federal e estaduais rejeitam categoricamente. Todos eles insistem que as medidas contra a pandemia devem se subordinar aos interesses da “economia”.

É por isso que eles inundam as corporações e bancos com bilhões, enquanto as escolas e hospitais carecem dos recursos mais básicos. Não é coincidência que o índice de ações do DAX tenha alcançado um novo recorde em meio à mais profunda crise.

O Sozialistische Gleichheitspartei (Partido Socialista pela Igualdade) e suas organizações irmãs no Comitê Internacional da Quarta Internacional convocam a construção de comitês de ação nas fábricas e nas escolas, para tomar em suas próprias mãos as medidas de proteção contra o vírus e preparar uma greve geral. Somente através da mobilização independente da classe trabalhadora a pandemia pode ser interrompida.

Essa ofensiva requer um rompimento político com os elementos da campanha #ZeroCovid que atuam para desviar a crescente oposição à política do governo deixando-a esgotar-se em sua ineficácia.

A campanha Zero-Covid foi originalmente lançada na Grã-Bretanha por apoiadores pseudoesquerdistas do ex-dirigente do Partido Trabalhista Jeremy Corbyn e antigos dirigentes sindicais. Todos são especialistas em asfixiar qualquer movimento social sob o disfarce de frases de esquerda. Corbyn, como líder da oposição, foi informado de que o governo de Boris Johnson estava seguindo uma política deliberada de imunidade de rebanho, mas não alertou ninguém. E a federação de sindicatos TUC garantiu que os perigosos locais de trabalho permanecessem abertos. Ela usou a pandemia para fortalecer sua colaboração com as associações patronais.

Operadores políticos similares também podem ser encontrados entre os autores do apelo alemão – incluindo Luisa Neubauer, do Partido Verde, Thies Gleiss, membro do comitê executivo do partido A Esquerda, e vários secretários sindicais. Eles pedem aos sindicatos que “tomem uma posição firme pela saúde dos trabalhadores, apoiem o ativismo dos trabalhadores por sua saúde, e organizem juntos a grande interrupção coletiva necessária [lockdown]”.

Mas os sindicatos, assim como os partidos do establishment, há muito tempo deixaram claras suas posições. Como fantoches corporativos, eles pressionam seus membros a trabalhar, apesar da ameaça do coronavírus, e negam categoricamente um lockdown. O chefe do maior sindicato industrial da Alemanha, IG Metall, Jörg Hofmann, havia confirmado isso três dias antes em uma entrevista ao Augsburger Allgemeine. Ele rejeitou a exigência de um lockdown rígido, dizendo: “Então, nosso poder econômico entraria em colapso”.

Em março, o partido A Esquerda e os Verdes apoiaram os pacotes de coronavírus da grande coalizão dos democratas-cristãos e socialdemocratas. Esses pacotes de bilhões de dólares beneficiaram principalmente as grandes corporações e bancos. Desde então, eles têm estado à frente da política de abertura da economia.

Não é por acaso que a Turíngia, o único estado governado por um primeiro-ministro do partido A Esquerda, é o primeiro colocado quando se trata do nível de incidência. O primeiro-ministro estadual Bodo Ramelow desempenhou um papel dirigente durante todo o ano, minimizando a pandemia e minando as medidas de proteção contra ela. O primeiro-ministro estadual do Partido Verde de Baden-Württemberg, Winfried Kretschmann, anunciou no dia 21 de janeiro que as escolas e creches seriam totalmente reabertas já em 1º de fevereiro.

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