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Professores de São Paulo entram em greve contra reabertura assassina de escolas

Cerca de 180 mil professores de São Paulo iniciaram uma greve por tempo indeterminado na segunda-feira contra o início do ensino presencial parcial nas escolas da rede pública estadual. A greve foi aprovada por 80% dos professores que participaram de uma assembleia virtual realizada na última sexta-feira, 5 de fevereiro.

Ontem, os professores foram às escolas no primeiro dia de aulas presenciais para conversar com os alunos e pais sobre a greve. Porém, apenas 5% dos alunos compareceram às escolas, o que mostra o medo dos pais em enviar seus filhos para as aulas presenciais em meio a uma pandemia fora de controle. No início da semana passada, as escolas particulares do estado já haviam sido reabertas com até 35% dos alunos nas salas de aula.

A reabertura de escolas em São Paulo aconteceu depois de o governador direitista João Doria (PSDB) decretar a educação um “serviço essencial”, permitindo que as escolas reabrissem nas fases “laranja” e “vermelha” do suposto plano de contenção da pandemia do estado, o “Plano São Paulo”. Antes, as escolas podiam reabrir apenas na fase “amarela”, com a pandemia supostamente “sob controle”. Hoje, a maioria das regiões do estado está nas fases “laranja” e “vermelha”, com as contaminações crescendo.

O secretário de educação de São Paulo, Rossieli Soares, está trabalhando em estreito contato com as mais significativas camadas da elite dominante brasileira para reabrir as escolas do estado. Isso inclui os setores empresariais e comerciais de São Paulo, sindicatos de donos de escolas particulares, um setor da classe médica brasileira, a mídia corporativa, fundações educacionais pró-empresariais e a justiça do estado.

Em 28 de janeiro, a juíza Simone Gomes, de São Paulo, acatou uma ação movida pelos sindicatos de professores contra a reabertura de escolas no estado. Baseando sua decisão na “proteção do direito à vida”, ela barrou a reabertura de escolas nas fases “laranja” e “vermelha” do “Plano São Paulo”. Um dia depois, a decisão foi revertida pelo Tribunal de Justiça do Estado.

Falando pelo governador de São Paulo, o secretário de educação do estado ameaçou na própria segunda-feira tomar as “medidas judiciais apropriadas” contra a greve, dizendo que os professores que não voltarem às salas de aula terão seus salários cortados.

A reabertura de escolas em São Paulo – o estado mais rico e industrial do Brasil, assim como o centro financeiro do país – sem dúvida abrirá o caminho para outros estados fazerem o mesmo. Dos 26 estados brasileiros, em vinte deles já estão previstas o início das aulas presenciais nas próximas semanas.

A reabertura de escolas no Brasil, assim como em todo o mundo, está sendo impulsionada pelas necessidades de bancos e corporações em reabrir a economia. A dinâmica da luta de classes está colocando cada vez mais os interesses de lucro da classe capitalista em reabrir as escolas contra os interesses da classe trabalhadora em salvar vidas e manter as escolas fechadas.

O início da greve em São Paulo acontece depois de os professores no Rio de Janeiro terem decidido entrar em greve contra a reabertura de escolas públicas estaduais e municipais em 30 de janeiro. Os professores do Paraná estão programados para entrar em greve em 18 de fevereiro, quando se iniciam as aulas presenciais no estado. Na quarta-feira, 10 de fevereiro, os professores da rede pública municipal de São Paulo realizarão uma assembleia para decidir se entrarão em greve contra o início das aulas presenciais, programadas para 15 de fevereiro.

A greve em São Paulo foi aprovada apesar dos esforços das organizações de pseudoesquerda que atuam no sindicato de professores, a APEOESP, para adiar o seu início. O morenista PSTU havia proposto adiar o início da greve para a próxima sexta-feira, 12 de fevereiro, enquanto a Resistência, uma das tendências do PSOL, havia proposto realizar uma nova assembleia apenas no dia 19 de fevereiro. A principal alegação deles era que era necessário “construir” o apoio para a mobilização de greve, mesmo com a ameaça de mais casos e mortes por COVID-19 diante da reabertura de escolas.

Expressando o pessimismo de classe médio e o desprezo pela vida da classe trabalhadora brasileira dessas tendências, o líder sindical da Resistência, João Zafalão, argumentou na assembleia de sexta-feira: “A política ideal, aquela dos sonhos, seria decretar greve [agora] .... O problema é que a vontade nossa não é capaz, neste momento, de superar a realidade.” Isso significa que, para ele, a pandemia de COVID-19 não faz parte da “realidade” brasileira. Até domingo, o site da Resistência, Esquerda Online, não havia publicado uma palavra sobre a greve dos professores de São Paulo.

Os professores que participaram da assembleia virtual reagiram com revolta à proposta dos líderes sindicais morenistas. Eles escreveram no chat da assembleia virtual: “A diferença de calendário pode significar mais ou menos VIDAS!!!”; “Chega de desculpas. Construir o que? Covas?”; “A única necessidade para entrar em greve imediatamente é o senso de realidade! Um ano de Pandemia e quer esperar mais o quê??? GREVE PELA VIDA, JÁ!”

A reabertura de escolas está acontecendo com a pandemia ainda fora de controle em São Paulo. Além da enorme subnotificação de casos e mortes, o governo Doria tem realizado alterações constantes nos critérios do “Plano São Paulo” para forçar a reabertura dos negócios e das escolas do estado. Escrevendo para a Folha de S. Paulo no início da segunda onda no Brasil, em novembro, três professores da USP denunciaram o “Plano São Paulo”, dizendo que “nunca foi um plano de contenção, mas de flexibilização da atividade econômica apesar da pandemia.”

No final de janeiro, o professor da UNESP Alexandre Naime afirmou ao UOL que, por causa do agravamento da situação da pandemia e da detecção em São Paulo da nova cepa mais contagiosa do coronavírus identificada em Manaus, o estado precisaria de “algo próximo de [um] lockdown”. Porém, segundo ele, “cada vez que agrava o problema, mudam a regra para deixar a classificação [do Plano São Paulo] mais branda”. Além da nova variante de Manaus, no final de dezembro foi detectada em São Paulo a também mais contagiosa variante britânica do coronavírus.

Na última atualização do “Plano São Paulo”, realizada na última sexta-feira, a situação da pandemia em 10 das 17 regiões do estado supostamente “melhorou”, de acordo com o governo Doria. Mesmo assim, sete regiões de São Paulo estão na fase “amarela”, sete na fase “laranja” e três na fase “vermelha”. Na fase “amarela”, além de serviços não essenciais poderem funcionar por mais tempo, o limite de estudantes nas salas de aula aumenta de 35% para 70%.

O principal critério que levou o governo do estado a relaxar o “Plano São Paulo” foi a pequena diminuição de 71,6% para 67,2% na ocupação média de leitos de UTIs no estado. Porém, além de esconder o fato de o número de leitos de UTIs no estado ter aumentado nas últimas semanas com o agravamento da pandemia, desconsidera o alto número de casos e óbitos ainda registrados em São Paulo durante a segunda onda da pandemia.

No último mês, a média de mortes por COVID-19 permaneceu acima de 200 por dia, tendo alcançado 365 no dia 2 de fevereiro, o maior número desde 9 de setembro. Em janeiro, o número de mortes no estado de São Paulo foi 37% maior do que em dezembro. Já o número médio de casos no estado permaneceu acima de 10 mil por dia ao longo do último mês, com janeiro tendo sido o mês com o maior número de casos desde o início da pandemia em São Paulo. O estado registra mais de 1,8 milhão de casos e 55 mil mortes. Em comparação, a Califórnia, o estado americano com o maior número de casos, possui 3,4 milhões de casos e 43 mil mortes.

A reabertura parcial das escolas particulares para aulas presenciais e das escolas públicas estaduais para reunião de professores desde 1˚ de fevereiro já levou a dezenas de novos casos e surtos em escolas. A APEOESP registrou 147 casos confirmados de COVID-19 em 79 escolas da rede pública estadual ao longo da semana passada. Em uma escola particular em Campinas, no interior de São Paulo, 39 funcionários e 8 alunos tinham testado positivo até quinta-feira passada, e uma professora precisou ser internada.

A APEOESP, cuja presidente é a deputada estadual pelo Partido dos Trabalhadores (PT) Maria Izabel Noronha, conhecida como Bebel, tem insistido que a volta às aulas deve acontecer depois da vacinação dos professores. Essa proposta, no entanto, ignora o fato de as vacinas aprovadas no Brasil não estarem ainda disponíveis para crianças e adolescentes, que são um significativo vetor de transmissão do coronavírus e continuarão se contagiando e transmitindo o vírus mortal para suas famílias.

De maneira mais significativa, essa proposta bloqueia uma luta unificada com outros setores de trabalhadores para a implementação de medidas que contenham a propagação do vírus em São Paulo e em todo o Brasil. Diante de uma pandemia fora de controle e o colapso das campanhas de vacinação, a única medida capaz de diminuir as infecções e salvar vidas é o fechamento dos serviços e da produção não essencial, assim como de escolas, com a compensação financeira a todos os afetados, até que a pandemia seja erradicada.

Essa exigência, no entanto, tem sido ignorada não só pelos partidos burgueses brasileiros, incluindo o PT, mas também pelas tendências de pseudoesquerda que orbitam o PT e estão hoje oferecendo uma cobertura de esquerda a uma fração da elite dominante brasileira que possui diferenças táticas com o presidente fascista Jair Bolsonaro.

Os professores de São Paulo estão iniciando a mesma luta que agora está sendo travada pelos professores de Chicago, que estão se confrontando com a prefeita democrata da cidade, o governo Biden e o Sindicato de Professores de Chicago (CTU).

Uma luta genuína contra a reabertura assassina de escolas requer a construção de comitês de base independentes dos sindicatos. Comitês como esses estão sendo criados em Chicago e em outras cidades e estados por todo os EUA, assim como na Europa e na Austrália, liderados pelas seções nacionais do Comitê Internacional da Quarta Internacional. Esses comitês devem ser construídos para coordenar as lutas dos professores com outros setores da classe trabalhadora em São Paulo, em todo o Brasil e internacionalmente para colocar a vida humana acima dos lucros e salvar vidas.

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