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Presidente da Ucrânia pede que OTAN intensifique intervenção militar no Mar Negro enquanto imprensa russa alerta sobre guerra

Publicado originalmente em 7 de abril de 2021

Na terça-feira, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky conversou com o secretário geral da OTAN Jens Stoltenberg em meio a tensões crescentes com a Rússia no Leste da Ucrânia. Nas últimas semanas, os combates se intensificaram na região de Donbass entre o exército ucraniano e os separatistas apoiados pela Rússia. A região tem sido assolada por uma guerra civil desde o golpe de 2014 em Kiev, apoiado pelos EUA e pela Alemanha, que dependeu fortemente de forças neonazistas.

A guerra já matou mais de 14.000 pessoas e deslocou milhões. Nos últimos três meses, estima-se que 40 pessoas tenham sido mortas nos confrontos. Separatistas no Leste da Ucrânia afirmam que pelo menos uma criança foi morta nos combates desta semana.

O Presidente da Ucrânia Volodymyr Zelensky (Crédito: en.kremlin.ru)

No último fim de semana, a Ucrânia e a OTAN anunciaram exercícios militares conjuntos. Agora, Zelensky está pedindo à OTAN que acelere a admissão da Ucrânia na aliança militar. Ele insistiu que a Otan reforce sua presença militar na região do Mar Negro, alegando que tal movimento agiria como um “poderoso elemento dissuasor” para a Rússia.

Após a reunião, Stoltenberg tuitou: “A OTAN apoia firmemente a soberania e a integridade territorial da Ucrânia. Continuamos comprometidos com nossa estreita parceria.”

Antes da reunião com Stoltenberg, Zelensky conversou na sexta-feira com o presidente americano Joe Biden, que garantiu que a Ucrânia receberia o apoio total de Washington. Na segunda-feira, o Departamento de Estado dos EUA declarou que recebeu relatos “confiáveis” de movimentos militares russos na fronteira da Ucrânia e exigiu que Moscou explicasse as “provocações”. O Primeiro Ministro britânico Boris Johnson também conversou com Zelensky.

Mais tarde, na terça-feira, o Ministro das Relações Exteriores da Ucrânia declarou que Kiev não aceitaria um convite para conduzir negociações de paz em Minsk, onde elas estão acontecendo desde 2015, envolvendo a Rússia, Ucrânia, Alemanha e França.

As acusações de “agressão” e “provocações” russas servem para fazer as pessoas pensarem o contrário do que está acontecendo. As condições para a atual escalada foram criadas, acima de tudo, pelos movimentos agressivos dos imperialismos americano e alemão que, desde a dissolução stalinista da União Soviética em 1991, têm se aproximado cada vez mais das fronteiras da Rússia, sobretudo através da expansão da OTAN para o leste.

Na Ucrânia, dois golpes foram orquestrados pelas potências imperialistas em 2004 e 2014 para instalar regimes pró-ocidentais que poderiam desempenhar um papel fundamental nos preparativos para uma guerra contra a Rússia.

Quaisquer que sejam suas promessas de lutar por um “acordo de paz”, que desempenhou um papel fundamental na vitória eleitoral de Zelensky em 2019, ele deu continuidade efetiva às políticas de seu antecessor, Petro Poroshenko. No mês passado, o governo ucraniano anunciou uma estratégia para “recuperar a Crimeia”, uma península estrategicamente localizada no Mar Negro que foi anexada pela Rússia após o golpe de 2014. Em seguida, aprovou uma nova estratégia militar com o objetivo de preparar uma guerra contra a Rússia com o apoio da OTAN.

Há dois dias, a imprensa russa informou que a Ucrânia havia reunido uma força ofensiva na região de Donbass e na região ao redor do istmo da Crimeia. Também houve inúmeros relatos não confirmados de movimentos de tropas russas na e perto da Crimeia. O Canadá e vários países europeus emitiram alertas para “ter cuidado ao sobrevoar a Ucrânia”. O Canadá também desencorajou suas companhias aéreas de sobrevoar o Leste da Ucrânia e a Crimeia devido à “situação instável da segurança”.

Kiev está aproveitando a escalada da situação para promover a campanha anti-Rússia nos EUA e intensificar o envolvimento militar na região. Ben Hodges, ex-comandante do Exército dos EUA na Europa, exigiu na revista militar Defense One que os EUA desenvolvam uma estratégia para toda a região do Mar Negro e deixem claro que ela é “vital” para os interesses americanos. Ele também pediu mais ajuda para a Ucrânia e exercícios estratégicos na região. Da mesma maneira, o think tank de política externa Atlantic Council exigiu que os EUA forneçam à Força Aérea Ucraniana caças, munições inteligentes e mísseis de cruzeiro.

Sob Trump, os EUA começaram a fornecer armas para a Ucrânia, além de canalizar centenas de milhões de dólares para o financiamento das forças armadas ucranianas. Em março, um grupo formado por senadores democratas e republicanos propôs outro pacote de ajuda de 300 milhões de dólares.

Os EUA também desempenharam um papel fundamental no apoio político e financeiro às forças neonazistas ucranianas que, por sua vez, foram integradas ao Estado e ao governo ucraniano. O Ministro do Interior de Zelensky, Arsen Avakov, é conhecido por seus laços com o neonazista Batalhão Azov e forças semelhantes de extrema direita que tinham desempenhado um papel central no golpe de 2014.

Desde então, eles receberam total liberdade para aterrorizar minorias étnicas e opositores políticos do governo ucraniano e da extrema direita. São também principalmente essas forças que estiveram envolvidas nos combates no Leste da Ucrânia.

Os confrontos militares na região do Mar Negro estão ocorrendo diante de tensões geopolíticas crescentes, especialmente entre os EUA e a China, mas também entre as potências imperialistas. E o novo governo Biden se lançou num curso militar agressivo tanto em relação à Rússia quanto à China.

Poucas semanas após tomar posse, Biden bombardeou a Síria, em um movimento que visava não só o Irã, mas também a Rússia e a China. Em uma quebra extraordinária do protocolo, o presidente dos EUA chamou o presidente russo Vladimir Putin de “assassino”. Em resposta, o Kremlin convocou seu embaixador nos EUA a deixar o país.

Fyodor Lukyanov, um dos principais jornalistas de política externa russa com laços estreitos com o Kremlin, comentou que isto não era suficiente. Ele insistiu que agora era a “hora de fazer uma ruptura nas relações EUA-Rússia, um novo compromisso é inútil por enquanto”.

Na Rússia, os movimentos de Zelensky são vistos como preparativos abertos para uma guerra e têm provocado um considerável nervosismo. Shamil Gareev, especialista militar e oficial de reserva, disse ao Nezavisimaya Gazeta que “O início dos exercícios da OTAN Defender Europe 2021 coincide claramente com a discussão da imprensa sobre possíveis planos temporários de Kiev para iniciar ações militares ativas na Crimeia e Donbass”. Ele acrescentou: “Não está excluído que Kiev iniciará seu principal ataque a Donbass em maio ou possivelmente no início de julho”.

Outros estão comparando a situação com a véspera da guerra entre a Geórgia e a Rússia em 2008, que levou o mundo à beira de um confronto entre os EUA e a Rússia. O Kremlin tem insistido que não quer guerra com a Ucrânia, mas agora está claramente se preparando para tal possibilidade.

O Ministro das Relações Exteriores russo Sergei Lavrov tem expressado indignação, em particular, contra a Alemanha e a França, acusando-as de não fazerem nada para “trazer a Ucrânia de volta ao normal”. Na sexta-feira, o Ministro da Defesa alemão Annegret Kramp-Karrenbauer, em entrevista à Redaktionsnetzwerk Deutschland, pediu um aumento ainda maior dos gastos militares alemães.

Kramp-Karrenbauer enfatizou que o rearmamento militar alemão não significa “fazer um favor aos EUA”, mas sim servir “nossos próprios interesses”. Ela se referiu explicitamente à China e à Rússia como os principais alvos da escalada militar, descrevendo a Rússia como “uma ameaça muito palpável, tanto em nível convencional quanto atômico [de guerra]”.

A entrevista recebeu ampla cobertura da imprensa na Rússia e foi imediatamente discutida pela comissão de relações exteriores da Duma (Parlamento). Embora a maioria dos especialistas de imprensa e políticos tentassem minimizá-la, sugerindo que Berlim provavelmente não considerava Moscou como um inimigo, isso claramente suscitou preocupação.

Nos últimos meses, as relações entre a Rússia e a Alemanha se deterioraram consideravelmente, uma vez que Berlim assumiu um papel de liderança na campanha em relação ao opositor de direita Putin Alexei Navalny.

Há conflitos contínuos dentro da própria classe dominante alemã sobre sua política em relação à Rússia. Muitos destes conflitos centram-se no gasoduto germano-russo Nord Stream 2, que sofreu sanção dos EUA. Em sua primeira reunião com o Secretário de Estado americano Antony Blinken, o Ministro das Relações Exteriores alemão Heiko Maas insistiu que a Alemanha continuaria com o projeto, apesar da oposição dos EUA.

Um comentário de Daniel Brössler no Sueddeutsche Zeitung na terça-feira exigiu que, em resposta à crise na Ucrânia, “O Ocidente deve ameaçar com sanções que machuquem”. E continuou: “O show de força militar da Rússia na fronteira da Ucrânia deveria finalmente fazer com que a UE tomasse uma posição clara e atuasse de forma dissuasiva, juntamente com os EUA”. Uma guerra entre a Rússia e a Ucrânia significaria o “fim do Nord Stream”, insistiu. “Pelo menos isso deve agora ficar claro.”

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