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Escolas reabrem em meio a mortalidade infantil recorde por casos de COVID-19

Retorno às aulas presenciais no Brasil, 2021 (Wikimedia Commons)

Publicado originalmente em 30 de julho de 2021

Uma reportagem do UOL no dia 20 revelou que a COVID-19 se tornou a causa principal de morte entre crianças entre 10 e 19 anos de idade no Brasil. Apenas nos primeiros seis meses de 2021, 1.581 jovens dessa faixa etária morreram por COVID-19. Em contraste, houveram 1.406 óbitos por câncer em todo o ano de 2019.

O número de óbitos de crianças mais novas também é alarmante, com dados do Ministério da Saúde mostrando que houveram 1.187 óbitos de crianças menores de 10 anos por COVID-19 em 2020. Entretanto, os dados da Vital Strategies, que levam em conta a explosão de óbitos por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), apontam para 3.129 vidas perdidas.

O epidemiologista e professor da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Paulo Martins-Filho, disse que 'esse aumento no número de hospitalizações e óbitos pela COVID-19, observado especialmente a partir de fevereiro e março, é reflexo da alta taxa de transmissão comunitária e da circulação de variantes de preocupação em território nacional'. Ele acrescentou que 'para as crianças, a pandemia também foi associada a profundas mudanças educacionais, sociais e psicológicas, insegurança alimentar ... que podem resultar em morte em regiões mais carentes'. Ele concluiu que 'a doença surgiu como uma nova causa de morte entre crianças em comunidades pobres, conforme observado nas regiões Norte e Nordeste do Brasil'.

Em entrevista à CNN Brasil, a pediatra da Universidade de São Paulo (USP), Ana Escobar, disse que a variante Gama, que teve origem e se tornou predominante no Brasil nos primeiros meses do ano, foi uma causa direta da disseminação da doença mortal entre os jovens. Ela explicou que ela é capaz de entrar mais facilmente nas células do corpo e alertou para o potencial de um novo surto de óbitos, que não pouparia crianças e adolescentes: 'a variante Delta, que já está no país, é ainda mais eficiente'.

No Brasil, a pandemia da COVID-19 continua causando mais de mil óbitos por dia, enquanto a média móvel está novamente em ascensão, registrando 45.094 casos diários. No domingo, as vacinações com a primeira dose foram suspensas em oito capitais, aguardando a entrega de novos lotes de vacinas pelo governo federal.

Enquanto isso, os governadores estaduais, incluindo aqueles do Partido dos Trabalhadores (PT) e do Partido Socialista Brasileiro (PSB), estão sinalizando seu apoio aos interesses da classe dominante, promovendo a vacinação de pequenas porcentagens da população enquanto reabrem escolas e toda a economia.

O governador do Maranhão do PSB, Flávio Dino, anunciou na semana passada o início das aulas presenciais em 2 de agosto e a reabertura completa dos teatros, igrejas, comércio e grandes eventos. Ele justificou as suas medidas afirmando que 'Nós temos o uso obrigatório de máscara e distanciamento social. Isso é decisivo, tanto quanto a vacina'. A partir dessa premissa... estamos avançando na flexibilização das atividades econômicas'. Enquanto isso, o governador Rui Costa do PT seguiu a mesma política e ameaçou os professores do estado da Bahia que teriam seus salários cortados se se recusassem a entrar nas escolas.

As reaberturas que estão sendo levadas adiante pelo PT e pelo PSB mostram que essas organizações defendem os interesses capitalistas tão agressivamente quanto os partidos abertamente direitistas, promovendo o retorno das crianças às escolas e de seus pais às fábricas e locais de trabalho inseguros. Eles estão agindo alinhados à campanha aberta do presidente fascistoide do Brasil, Jair Bolsonaro, contra os lockdowns e pelo espalhamento da COVID-19 entre a população.

Até o momento, 12 estados já reabriram as suas escolas públicas, enquanto a maioria dos estados estão marcados para reabrir em agosto. Algumas capitais, como o Rio de Janeiro, planejam reabrir suas escolas municipais em setembro, e as escolas privadas já estão abertas em 22 estados.

Em São Paulo, onde há 3,6 milhões de alunos matriculados no sistema escolar estadual, o governador João Doria do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) anunciou planos em 16 de junho para ampliar a ocupação máxima das escolas de 35% para 100%. Na quarta-feira, o governador declarou que 'as coisas estão voltando ao normal' e anunciou o fim de todas as restrições no horário de funcionamento e no limite de ocupação de todas as atividades econômicas em 17 de agosto, dois dias após o início das primeiras doses da vacina para jovens de 18 anos.

Com esse anúncio, Doria pretende promover a injeção com a primeira dose de 56% da população de um único estado como 'imunização' bem-sucedida, utilizando como pretexto a queda nas taxas de hospitalização e no número de óbitos. O esforço para reabrir a economia a todo custo ignora a necessidade de completar a segunda dose para toda a população, com apenas 19% imunizados no país, sem mencionar a necessidade de imunizar todas as pessoas com menos de 18 anos de idade.

Entretanto, após meses de recusa, em que os pais e os professores não permitiram que seus filhos e estudantes entrassem nas escolas e em meio aos contínuos protestos em massa contra a resposta criminosa de Bolsonaro à pandemia, Doria teme que a sua campanha de um ano para trazer os alunos de volta às escolas provoque um aumento de oposição não apenas à reabertura das escolas, mas contra todo o establishment político e a sua política durante a pandemia. O governador anunciou que cada escola irá poder decidir seu limite de ocupação e declarou que os pais irão decidir sobre as atividades presenciais de seus filhos.

Se os governadores são capazes de pressionar pela reabertura das escolas é porque podem contar com os sindicatos, que têm isolado e suprimido as lutas dos professores a cada passo.

Durante o mês de março, exatamente quando a segunda onda de COVID-19 estava começando, o sindicato dos professores estaduais de São Paulo, APEOESP, e o sindicato de professores municipais da capital, SINPEEM, recusaram-se a realizar uma greve conjunta contra a reabertura das escolas, e muito menos a convocar uma greve nacional em meio aos protestos de professores e de outros setores da classe trabalhadora em todo o país.

Ambos os sindicatos são filiados à Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), controlada pelo PT, que publicou um artigo no dia 19 noticiando um estudo mostrando que 'máscaras mal utilizadas podem elevar em 1000% os casos de COVID-19'. Em vez de lutar contra a reabertura das escolas, os sindicatos já estão transferindo a culpa de um futuro surto de casos para os próprios estudantes.

Na segunda-feira, dando cobertura para os esforços do governador Doria, a APEOESP publicou uma suposta defesa contra atividades presenciais que, na realidade, segue a linha do governador. O sindicato afirma que 'Para a volta às escolas, é preciso que todos os profissionais da Educação tenham recebido a segunda dose da vacina'. O sindicato deixa de mencionar os perigos de permitir que milhões de crianças entrem em escolas lotadas, que poderiam se tornar locais críticos de propagação do coronavírus.

Em um artigo na Folha de São Paulo, a deputada estadual e presidente da APEOESP, Maria Izabel Azevedo Noronha, conhecida como “Bebel”, considerou como exemplar o fato de que 'Na Alemanha, estudantes são testados uma vez por semana e salas estão limitadas a 15 alunos, com distância mínima de até dois metros'. Ela acrescenta referências ao Reino Unido, EUA e França como exemplos de ensino presencial durante a pandemia.

A APEOESP está encobrindo o fato de que a política do governo britânico durante a pandemia, incluindo aulas presenciais, resultou no espalhamento da variante Delta pelo país, e que as crianças atualmente correspondem a 8% de todas as hospitalizações no país.

Ao permitir aulas presenciais em agosto, enquanto menos de um quarto da população brasileira está vacinada, o sindicato dos professores dá crédito à mentira de que as crianças não transmitem o coronavírus, algo que foi promovido não apenas pela grande mídia, pelos governadores e pelo movimento Escolas Abertas no Brasil, mas também repetido pelo presidente Biden nos EUA.

Os resultados mortais de tal política já estão sendo vistos nos estados que reabriram as escolas. No Rio Grande do Sul, onde as escolas foram reabertas em maio, os dados coletados até 12 de julho mostram que apenas na rede estadual havia 3.696 casos entre alunos, professores e funcionários, dos quais metade eram alunos. Apenas 186 mil alunos estão participando das atividades presenciais, ou 20%, o que mostra que uma reabertura total seria um fator importante para produzir uma terceira onda catastrófica.

Os trabalhadores devem se opor ao 'novo normal' promovido pela classe dominante, no qual eles e seus filhos continuam colocando suas vidas em risco dentro de locais de trabalho e escolas lotadas. Assim como o vírus desenvolveu novas variantes quando os governos retiraram os lockdowns e restrições, ele continuará desenvolvendo variantes novas e ainda mais mortais, principalmente em regiões com baixas taxas de vacinação.

A luta dos professores contra a reabertura das escolas só foi derrotada porque os sindicatos foram capazes de suprimir uma luta unificada em todo o Brasil e internacionalmente.

A continuação da greve dos professores do estado de Sergipe, aprovada no dia 20, e as atuais reuniões na Bahia entre Rui Costa do PT e o sindicato são ambas baseadas na mesma proposta falida de aceitar a reabertura total em troca da segunda dose da vacina para os professores. Assim como em São Paulo, os sindicatos SINTESE e APLB estão manobrando para entregar a luta dos professores, mantendo-a isolada.

Além disso, mesmo que a mídia e o governo tentem promover a campanha nacional para imunizar a população brasileira como a solução final da pandemia, a propagação da variante Gama em toda a região mostrou que somente uma resposta internacional à pandemia será capaz de detê-la.

No 1º de Maio, o Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI) lançou a Aliança Operária Internacional dos Comitês de Base (AOI-CB) para dar expressão unificada e organizada às lutas dos trabalhadores.

O fim da morte em larga escala e a prevenção do surgimento de uma nova variante, potencialmente ainda mais transmissível e mortal, exige a interrupção de todos os setores não-essenciais da economia através da mobilização em massa dos professores e de todos os outros setores da classe trabalhadora. Somente através de uma luta unificada da classe trabalhadora internacional, os recursos da sociedade podem ser direcionados para garantir a segurança de todos os trabalhadores, com protocolos de higiene rigorosos e equipamentos de proteção individual em locais de trabalho nos setores essenciais. No caso dos professores e de seus alunos, eles devem receber computadores e internet de alta velocidade para garantir ensino remoto de alta qualidade.

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