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Perspectivas

Quem é responsável pela fome e aumento de preços dos alimentos?

Publicado originalmente em 24 de maio de 2022

Acompanhando a administração Biden, os políticos capitalistas, empresários e os jornalistas comprados por todo o mundo derramaram lágrimas de crocodilo pela crise alimentar global, que eles declaram ter sido criada unicamente por Vladimir Putin.

Discursando para uma multidão bem alimentada no Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíça, na segunda-feira, a presidente da Comissão Européia, Ursula von der Leyen, declarou existir uma preocupação com os “países frágeis e populações vulneráveis” que “mais sofrerão” com o aumento dos preços dos alimentos. A multidão de bilionários aplaudiu com convicção quando a ex-ministra da Defesa alemã culpou a Rússia por lucrar “vergonhosamente” com a fome. Os chefes acenaram de modo favorável quando ela pediu que o público a abastecesse “o Programa Mundial de Alimentos com os suprimentos de que ele tanto necessita” para aliviar a ameaça da fome em massa.

Isso é pura hipocrisia. Há seis meses, o presidente do Programa Mundial de Alimentos da ONU, David Beasley, lançou um “apelo único aos bilionários para ajudar a combater a fome”, explicando que, se as pessoas mais ricas do mundo doassem apenas US$ 6,6 bilhões (ou 0,04%) de seus coletivos US$ 13,1 trilhões em riqueza, a fome mundial poderia ser eliminada em 2022 e milhões de vidas poderiam ser salvas.

Esse pedido foi previsivelmente ignorado e, nos últimos seis meses, 4,5 milhões de seres humanos morreram da forma mais primitiva possível em um mundo moderno, de enorme progresso tecnológico. A cada ano, 9 milhões de pessoas morrem de fome com quase nenhuma atenção da mídia capitalista, que só aponta para os mortos quando se trata de publicar propaganda de guerra.

A verdadeira causa da fome em massa no mundo é o capitalismo. Nesta semana, a organização Oxfam publicou um relatório detalhando o crescimento massivo da desigualdade social durante a pandemia de COVID-19, que já matou 20 milhões de pessoas. A Oxfam relatou que surgiu um novo bilionário “a cada 30 horas em média durante a pandemia”, incluindo 62 indivíduos na indústria do agronegócio, que lucraram com o aumento dos preços dos alimentos. O relatório aponta: “As empresas e as dinastias bilionárias, que controlam tanto do nosso sistema alimentar, estão vendo seus lucros dispararem”.

Por exemplo, quando von der Leyen denunciou Vladimir Putin por “usar a fome e os grãos para exercer o poder”, dois homens estavam presentes ‒ David MacLennan, presidente da Cargill, e Brian Sikes, vice da empresa ‒ possivelmente aplaudindo. Porém, de acordo com o relatório da Oxfam, a riqueza combinada da família Cargill aumentou em US$ 14,4 bilhões desde o início da pandemia, o suficiente para alimentar os famintos do mundo duas vezes e ainda restarem bilhões de dólares.

Como foi demonstrado pela pandemia de COVID-19, não há limite para o número de vidas que a classe capitalista irá sacrificar ao invés de abdicar de uma pequena fração da sua riqueza. Os arquitetos da guerra por procuração dos EUA/OTAN contra a Rússia estão igualmente preparados para sacrificar as vidas de bilhões de trabalhadores ‒ tanto através da fome como da catástrofe nuclear ‒ com o objetivo de subjugar a Rússia e conquistar suas riquezas.

Quanto ao atual aumento dos preços dos alimentos, o governo dos EUA e seus aliados imperialistas são os principais responsáveis. Joe Biden declarou repetidamente que o objetivo do governo dos EUA é assegurar uma “guerra longa e dolorosa”, e o aumento dos preços dos alimentos é em grande parte um resultado das sanções implementadas sob a liderança dos EUA. Como resultado do prolongamento da guerra, “milhões de pessoas morrerão”, como disse o ministro das Relações Exteriores do Egito ao Financial Times.

Um especialista do setor disse ao Conselho de Segurança da ONU na semana passada: “Isso é sísmico. Nós enfrentamos o risco de uma quantidade extraordinária de sofrimento humano”. Segundo um relatório de 23 de maio do Eurasia Group, em apenas 90 dias, 400 milhões de pessoas entraram em situação de insegurança alimentar, elevando o total para espantosos 1,6 bilhão. O mesmo relatório explica que, se a guerra continuar, os preços globais dos alimentos irão aumentar 45% este ano, um aumento sem precedentes.

O projeto de lei de auxílio militar de US$ 40 bilhões aprovado pelo congresso americano neste mês tem como objetivo prolongar intencionalmente a guerra e irá intensificar massivamente a crise alimentar, interrompendo o plantio nas próximas safras. A pequena parcela que o projeto de lei direciona para a ajuda “humanitária” é apenas uma fachada. Quase toda essa parcela irá acabar nos bolsos de autoridades corruptas e criminosas, assim como a “ajuda” fornecida pelos EUA durante as ocupações do Afeganistão e do Iraque.

Todo político e organização que apoiou esse projeto de lei votou para tirar comida de milhões de trabalhadores em todo o mundo. Isso inclui Alexandria Ocasio-Cortez, Bernie Sanders, Rashida Tlaib, Ilhan Omar e Jamaal Bowman, os Socialistas Democráticos dos EUA, e grupos internacionais de “esquerda” como a Liga Internacional Socialista, o Novo Partido Anticapitalista francês e partidos verdes em todo o mundo. Em seu apoio à guerra, eles se marcaram indelevelmente como inimigos da classe trabalhadora, para quem a guerra está tendo um impacto catastrófico.

A intensificação da crise alimentar está empurrando as massas de trabalhadores para a luta de classes. Os níveis massivos de desigualdade social e o constante direcionamento de dinheiro para os mercados financeiros criaram uma inflação desenfreada que está aumentando os custos de todos os produtos e necessidades básicas.

David Beasley, diretor do Programa Mundial de Alimentos, advertiu recentemente: “Já estamos vendo tumultos e protestos ocorrendo neste momento ‒ Sri Lanka, Indonésia, Paquistão, Peru. Já vimos dinâmicas desestabilizadoras no Sahel de Burkina Faso, Mali, Chade. Esses são apenas sinais do que está por vir”.

Protestos em massa agora surgiram em todo o Irã, onde um aumento de 300% nos alimentos à base de farinha provocou manifestações coincidindo com greves de trabalhadores em cidades como Teerã, com uma população de 8,5 milhões. Protestos e greves de caráter nacional continuam ocorrendo no Sri Lanka, Peru e em outros lugares.

Em todos os países, os sindicatos servem para frear a luta de classes e impedir que os trabalhadores travem uma luta unificada para atender às necessidades sociais urgentes.

Na Tunísia, a principal confederação sindical foi forçada a anunciar os preparativos de uma greve geral para afastar o espectro das greves selvagens em massa. Os trabalhadores da área de saúde em todo o Cabo Oriental da África do Sul entraram em greve sem a aprovação dos sindicatos neste mês, como resultado do aumento dos preços dos alimentos e do impacto desastroso da pandemia no sistema de saúde. Motoristas de ônibus em Córdoba, Argentina, iniciaram uma greve selvagem por causa da comida e outros custos de vida.

Esse movimento não é isolado ao mundo em desenvolvimento. Os bagageiros em Copenhague lançaram uma greve selvagem no último fim de semana devido ao aumento do custo dos alimentos e outras necessidades básicas. Segundo a imprensa dinamarquesa, “O tribunal trabalhista dinamarquês decidiu no domingo que os bagageiros devem retornar ao trabalho na segunda-feira, mas isso não foi obedecido”. Os trabalhadores da indústria aeronáutica em Saint-Nazaire, França, iniciaram paralisações selvagens diárias por conta de salários e do aumento do custo de vida.

No Reino Unido, o banco central do Reino Unido chamou a crise do custo de vida de “apocalíptica”. Os trabalhadores estão enfrentando 9% de inflação e um aumento recorde de 54% nas contas de gás e eletricidade. De acordo com uma pesquisa da Ipsos, 85% dos britânicos estão preocupados com o impacto do aumento do custo de vida nos próximos seis meses.

Nesse contexto explosivo, a greve selvagem de mil trabalhadores em várias plataformas de petróleo e gás no Mar do Norte exigindo aumentos massivos de salários para responder pelo aumento do custo de vida é um sinal poderoso de que os trabalhadores veem os sindicatos como obstáculos ‒ não como facilitadores ‒ na luta contra o aumento do custo de vida. Embora a greve tenha sido escondida pela mídia corporativa, uma notícia do setor observou: “A revolução salarial começou ‒ não estamos falando de uma empresa, mas da indústria mundial como um todo”.

Não há como enfrentar a crise do custo de vida ou a crise alimentar global dentro de uma luta individual contra um empregador ou empresa, não importa o quanto militante. Na luta por alimentos acessíveis e necessidades básicas e um aumento massivo dos salários, a classe trabalhadora deve se unir em todos os locais de trabalho, indústrias e países para utilizar toda a sua força.

Essa é uma luta política contra toda a classe capitalista e os governos que ela controla. Ela não pode ser vencida sem interromper a guerra imperialista, que drena a capacidade tecnológica e o poder industrial da humanidade, direcionando-a para a morte e a destruição quando ela é desesperadamente necessária para salvar e melhorar vidas em todos os lugares. Isso exige uma revolução socialista, a expropriação da riqueza dos ricos e a colocação das forças produtivas do mundo sob o controle democrático da classe trabalhadora para abolir a fome e pobreza para sempre.

Chamamos para que todos os trabalhadores interessados se juntem a esse movimento internacional da classe trabalhadora e entrem em contato hoje com a Aliança Operária Internacional de Comitês de Base (AOI-CB).

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