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Burocratas do sindicato da Mercedes-Benz no Brasil viajam para Alemanha em meio a demissões

Publicado originalmente em 12 de novembro de 2022

Duas semanas atrás, as autoridades do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo (SMABC) retornaram de uma viagem à Alemanha para preparar uma nova armadilha para os trabalhadores da fábrica de caminhões da Mercedes-Benz (Daimler) em São Bernardo do Campo, que enfrentam milhares de demissões nas próximas semanas. No início de setembro, a fabricante declarou 3.600 demissões, incluindo a terceirização de múltiplos setores da fábrica.

Trabalhadores da Mercedes-Benz em assembleia em 8 de setembro de 2022. [Photo: Adonis Guerra/SMABC/FotosPublicas]

Após trabalhar nos últimos dois meses para impedir que os trabalhadores organizassem uma luta contra esses ataques, os burocratas snidicais anunciaram uma viagem para a Alemanha em outubro. O seu objetivo não era se reunir e organizar uma luta conjunta com os trabalhadores da Mercedes-Benz na Alemanha, que também enfrentam cortes de empregos e realizaram uma greve de um dia na semana passada contra o fechamento da planta no sul de Berlim. Ao contrário, eles foram realizar reuniões fechadas com os chefes na sede da empresa.

Conforme o diretor-executivo do SMABC, Aroaldo da Silva, admitiu em assembleia na semana passada, após a viagem: “O que a gente tem é o que a empresa falou, que não quer que fique nenhum contratado dentro da fábrica. ... O que nós temos nesse momento, não temos nada [pra apresentar] na verdade”.

Mesmo assim, os burocratas se reuniram com os trabalhadores para pedir que se submetessem ao “melhor PDV [plano de demissão voluntária] da história da fábrica” para supostamente “diminuir o impacto da terceirização”. Moises Selérges, presidente do SMABC, disse que a única linha de ação do sindicato será exigir um PDV feito com aprovação do sindicato. Ele declarou: “Os PDVs que a Mercedes lança não são negociados. Com exceção de 2016, não teve nenhum. Então um PDV desse teria que ser fruto de negociação e aprovado em assembleia”.

Silva defendeu os massivos cortes ao mesmo tempo em que identificou os interesses dos trabalhadores com aqueles dos empresários: “A gente quer tratar a fábrica como um todo. A história é com todo mundo, porque, se a fábrica fechar, [os impactados] são as áreas que a empresa quer fechar, são os mensalistas e são os chefes dentro da fábrica também”.

Longe de estar à beira da falência, como foi insinuado pelas autoridades do sindicato, a Mercedes-Benz anunciou “lucros robustos” no terceiro trimestre deste ano, ampliando sua receita bruta em 83% em relação ao mesmo trimestre do ano passado, subindo de €2,8 bilhões (R$14,5 bilhões) para €5,2 bilhões (R$26,8 bilhões). Largas margens desses números exorbitantes são direcionados para os bolsos dos acionistas e “chefes dentro da fábrica”.

Ao contrário de “diminuir o impacto” das terceirizações, o PDV colocaria imediatamente os trabalhadores efetivos sob ameaça de demissão caso não saiam da empresa no futuro próximo. Ele também significaria uma enorme precarização dos empregos, substituindo a maior quantidade possível de contratos efetivos por terceirizados e temporários com menores salários.

Em 2019, a GM demitiu milhares de funcionários na planta de São Caetano do Sul, com o Sindicato dos Metalúrgicos de São Caetano declarando que os cortes precisavam ser aceitos pois impediriam a saída da empresa do ABC e trariam novos investimentos. Em outubro do ano passado, após manter a linha de produção ininterrupta durante os piores surtos da pandemia, os trabalhadores da GM confrontaram um novo contrato com mais cortes salariais, de benefícios e que acabavam com a estabilidade para trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho. O contrato foi imposto mesmo diante de uma greve de 13 dias e enorme oposição dos trabalhadores porque o sindicato atuou a cada passo para isolar o movimento enquanto o Tribunal Regional do Trabalho preparava a sua ilegalização.

Essa é a mesma trajetória sendo tomada pelo SMABC na planta da Mercedes-Benz de São Bernardo. Dois meses após o sindicato declarar hipocritamente que “não aceitará demissões de trabalhadores”, as autoridades sindicais foram hoje claramente expostos trabalhando ao lado da companhia para permitir esses ataques.

Após chamar uma greve de três dias, o sindicato se manteve em silêncio enquanto a data dos desligamentos se aproximava para os trabalhadores por contrato. No dia 26 de setembro, a Mercedes iniciou a demissão sumária de centenas de trabalhadores por contrato uma semana antes do fim dos seus contratos. No mesmo dia, a empresa anunciou ter concluído um novo acordo para terceirizar a logística.

No dia 27 de setembro, enquanto os burocratas declaravam para os trabalhadores por contrato na sede do SMABC que nada poderia ser feito contra os desligamentos, os trabalhadores da logística na planta da Mercedes começaram uma greve contra a sua terceirização. A autoridade do sindicato, Aroaldo da Silva, foi responsável por interromper a paralisação espontânea, que ameaçava explodir em uma revolta mais ampla. Silva declarou sobre as terceirizações: “É preciso fazer todo o mapeamento possível para tentar diminuir o impacto no setor”. Ele declarou que o sindicato não aceitaria uma paralisação de todos os trabalhadores da logística “para não parar a fábrica”.

Hoje, as autoridades sindicais estão procurando desviar a própria responsabilidade enquanto compram tempo para a empresa cortar custos de trabalho na planta e apresentá-la como um local atrativo para investimentos.

A sua viagem à Alemanha ocorreu em meio a uma crise econômica global cada vez maior e a marcha dos governos imperialistas à guerra mundial, que está provocando enormes aumentos dos preços da energia na Europa. Em seu balanço trimestral, a Mercedes declarou estar preocupada com “incertezas no abastecimento de energia na Europa e os atuais desafios com a COVID na Ásia”. Em adição, a empresa estaria se preparando “para proteger cadeias de abastecimento e maximizar o potencial para reduzir ou substituir o uso de gás natural na produção de veículos”.

Nessas condições, o SMABC está fazendo apelos aos capitalistas alemães na liderança da Mercedes-Benz, prometendo estabilidade para suas lucrativas operações no Brasil através da supressão das lutas dos trabalhadores por melhores condições de vida. Essa orientação pró-capitalista corporativista foi delineada claramente no “Plano Indústria 10+” da IndustriALL Brazil, que conta com o SMABC como um de seus membros. Os sindicatos apresentaram o programa como a base para as políticas de trabalho do governo do Partido dos Trabalhadores (PT) do presidente-eleito Luís Inácio Lula da Silva.

Em contraposição à “estratégia” sugerida pelos burocratas sindicais para garantir os lucros da empresa, a paralisação espontânea da logística na planta de São Bernardo mostrou que os trabalhadores não estão dispostos a aceitar as massivas demissões e terceirizações.

Um dos trabalhadores por contrato desligados no início de outubro entrou em contato com o WSWS anonimamente para denunciar a companhia e as manobras falidas do sindicato. Ele disse: “A maior planta da Daimler [Mercedes-Benz] é aqui. É triste porque somos tratados como menos do que números, que dão o sangue para alcançar as metas da empresa. Ela só colhe os frutos por nossa causa, os trabalhadores”.

Sobre a viagem dos burocratas à Alemanha, ele disse: “Eu não estou com esperança porque eles estão indo lá pra falar com os empresários, então o que for em benefício dos empresários eles irão fazer. Você vê pelo que eles estão fazendo. Desde o dia 3 de outubro, quando eu saí, não houve nenhuma manifestação. A preocupação deles com os funcionários é zero. A preocupação deles é que o Lula ganhe a eleição”.

O trabalhador falou com o WSWS poucos dias antes do segundo turno da eleição presidencial no Brasil no dia 30 de outubro, que resultou na vitória do candidato do PT. O trabalhador apontou para o esforço dos burocratas sindicais, que declararam absurdamente que a chegada ao poder de Lula reverteria os cortes e demissões.

“Na verdade o sindicato sempre foi assim. Eles agem somente pela candidatura de alguém, e esquecem o principal, que é estar ao lado do trabalhador. Eles só atendem à burguesia, que são os empresários. Eles dizem que fazem, que vão paralisar, e não paralisam nada”.

Em oposição à política do SMABC de cortes nas condições de vida e empregos para competir por investimentos contra fábricas em outros países, os trabalhadores na planta de São Bernardo devem organizar um comitês de base independente para levar adiante a sua própria luta e entrar em contato com os trabalhadores alemães e em todo o mundo. A Aliança Operária Internacional de Comitês de Base (AOI-CB), promovida pelo WSWS, irá fornecer a estrutura necessária para essa luta internacionalmente unificada se desenvolver.

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