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Perspectivas

Presidente do Fed americano defende ditadura do capital financeiro

Publicado originalmente em 13 de janeiro de 2023

No início da semana, o discurso do presidente do Federal Reserve (Fed), o banco central americano, Jerome Powell, mostrou o caráter antidemocrático e ditatorial dos bancos centrais, agindo pelos interesses do capital financeiro, enquanto eles promovem uma política de aumento deliberado do desemprego no esforço para cortar os salários dos trabalhadores.

Em um simpósio em Estocolmo na Suécia, Powell disse: “Restaurar a estabilidade de preços com inflação alta pode exigir medidas que não são populares no curto prazo, pois aumentamos as taxas de juros para desacelerar a economia”.

Presidente do Federal Reserve (Fed), Jerome Powell, fala durante coletiva de imprensa no prédio do Conselho do Fed em Washington em 27 de julho de 2022. [AP Photo/Manuel Balce Ceneta]

Ele acrescentou: “A ausência de controle político direto sobre nossas decisões nos permite tomar essas medidas necessárias sem considerar fatores políticos de curto prazo”.

Em outras palavras, ao procurar impor “dor” econômica à população – na forma do aumento do desemprego para suprimir os salários dos trabalhadores – o Fed deve operar como uma lei justificada em si mesma, pelos interesses das corporações, do mercado de ações e do capital financeiro.

Os efeitos da política de guerra de classes do Fed já começaram a ser sentidos em numerosas demissões em empresas de alta tecnologia e empresas como a Amazon, atingindo dezenas de milhares de trabalhadores, enquanto as empresas da manufatura, incluindo a indústria automobilística, preparam medidas agressivas de redução de custos.

A justificativa de Powell para procurar aumentar o desemprego é a alegação de que o aumento dos salários está impulsionando a inflação. Na realidade, os salários reais estão caindo, mesmo enquanto os lucros das empresas crescem.

A crise inflacionária é impulsionada pelo impacto das políticas de dinheiro barato do Fed durante a última década e meia; a contração da força de trabalho devido às mortes por COVID, contínuas infecções e o impacto da COVID longa; a guerra dos EUA-OTAN contra a Rússia na Ucrânia; e, não menos importante, os aumentos de preços artificiais pelas grandes corporações, particularmente nos setores de alimentos e energia.

O Fed pretende colocar o peso dessa profunda crise do capitalismo sobre as costas da classe trabalhadora através de seu regime de taxas de juros elevadas.

Embora esse regime tenha causado turbulência no mercado de ações, ele é visto como o preço necessário a pagar pelo objetivo estratégico de suprimir a resistência da classe trabalhadora.

Quanto mais o aperto monetário perdurar, mais claro esse objetivo será estabelecido nas próprias declarações políticas do Fed e nas atas das reuniões de seu órgão diretor.

Os seus documentos e declarações estão repletos de referências ao “apertado” mercado de trabalho, em que mesmo os aumentos salariais limitados, bem abaixo da taxa de inflação, são incompatíveis com a sua meta de 2% de inflação, e que a oferta de mão de obra deve ser ampliada, ou seja, o desemprego deve aumentar.

Essas políticas, utilizando as próprias palavras de Powell, visam infligir “dor” a milhões de famílias de classe trabalhadora, enquanto impõem devastação sobre bilhões de pessoas em todo o mundo.

Ao impor suas políticas, o Fed, em conjunto com a mídia capitalista, promove a mentira de que suas medidas são realizadas em prol da economia e não por interesses de classe.

Porém, a história da “independência do banco central” mostra que essa demanda foi colocada em uma etapa definida da profunda crise do capitalismo mundial, que se acumulava há décadas.

A independência do banco central foi proposta no início dos anos 1990.

O capitalismo global havia acabado de concluir um programa de agressiva guerra de classes, liderado pelo então presidente do Fed, Paul Volcker, que instituiu um regime de juros recorde para esmagar um movimento salarial da classe trabalhadora. O regime induziu as recessões mais profundas desde a década de 1930, causando enorme devastação da qual áreas inteiras nos EUA ainda não se recuperaram.

O objetivo da independência do banco central era assegurar que essa arma da guerra de classes fosse permanentemente instalada.

Ela foi facilitada ideologicamente pela liquidação da URSS em 1991 e o triunfalismo capitalista que a acompanhou. Foi falsamente declarado que o fim da URSS demonstrava o fracasso do socialismo e que, portanto, o capital precisava estar livre para impor suas demandas.

A queda da inflação após o início da independência do banco central foi considerada uma prova da sua eficácia. Porém, a baixa inflação daquele período tinha pouca relação com as ações dos bancos centrais. Ela era o produto da globalização da produção, sobretudo da integração da China no mercado mundial, e da produção de bens de consumo mais baratos.

Foi declarado que a independência do banco central também era responsável pela chamada Grande Moderação, consistindo na baixa inflação, a ausência de grandes recessões e taxas de juros baixas.

Essa ficção explodiu em 2008 com a crise financeira global – o colapso mais grave desde a Grande Depressão dos anos 1930 – resultante inclusive da especulação a partir do fornecimento de dinheiro barato pelo Fed.

A crise foi uma experiência profunda para a classe trabalhadora nos EUA e internacionalmente.

Quando os trabalhadores perderam seus empregos, viram seus salários reduzidos, tiveram suas casas tomadas e passaram períodos consideráveis de tempo desempregados, eles testemunharam a entrega de enormes quantias às corporações e aos bancos através de resgates diretos do governo, e trilhões de dólares sendo dados pelo Fed, por meio da flexibilização quantitativa, aos bancos, especuladores e criminosos cujas atividades haviam provocado a crise.

A afirmação de que o Fed é uma instituição independente, acima dos interesses de classe e presidindo a atividade financeira pelo interesse da economia e da população, foi poderosamente atingida.

Essa mentira foi exposta ainda mais com o início da pandemia em 2020, quando o Fed injetou pelo menos US$4 trilhões no sistema financeiro para evitar o seu colapso.

Isso elevou à estratosfera a fortuna de magnatas como o chefe da Amazon, Jeff Bezos, enquanto a vida dos trabalhadores e de suas famílias foi devastada pela pandemia, e as condições de exploração do trabalho foram intensificadas na saúde, educação e muitos outros setores da economia.

Powell afirma que suas ações são justificadas pelo bem maior da “economia”.

Isso tem como objetivo colocar na mente dos trabalhadores a crença de que nada pode ser feito para mudar a situação atual, e que não existe outra alternativa senão submeter-se aos ditames da oligarquia financeira que impõe sobre eles a profunda crise da ordem capitalista.

A situação se apresenta de forma totalmente diferente quando se percebe que a sociedade e sua economia não são moldadas por condições eternas e inalteráveis, mas pela luta de classes.

Nessa luta, o Fed, que durante décadas estourou uma série de bolhas financeiras que enriqueceram massivamente a oligarquia financeira, fala em nome da classe dominante capitalista em seu esforço para empobrecer e oprimir a grande maioria da população.

A resposta da classe trabalhadora a essa ofensiva da oligarquia financeira está tomando a forma de um recrudescimento da luta de classes em todo o mundo. A classe trabalhadora deve levar adiante essa luta com uma luta consciente pelo socialismo, visando tomar o poder político, reconstruir a economia baseada na propriedade pública e no controle democrático, e garantir que seus vastos recursos sejam utilizados para atender à necessidade humana.

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