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Não à guerra entre Grécia e Turquia no Mediterrâneo Oriental!

Publicado originalmente em 12 de setembro de 2020

Em meio à escalada das ameaças e manobras navais entre Turquia e Grécia, a Europa e o Oriente Médio estão à beira de uma guerra. Neste verão, navios gregos colidiram repetidamente ou ameaçaram atirar em navios turcos, seus supostos aliados da OTAN, em meio a conflitos sobre fronteiras marítimas e acesso a campos de gás submarinos no Mediterrâneo Oriental, bem como em relação ao resultado da guerra de uma década na Líbia. Os mais urgentes alertas devem ser feitos. Se um conflito estourar no Mediterrâneo, isso ameaçaria se transformar em um conflito global.

Os riscos são admitidos abertamente por importantes autoridades. No mês passado, antes de viajar para Atenas e Ancara, o ministro das Relações Exteriores alemão Heiko Maas declarou: “A tensão não está afetando apenas a relação entre a UE e a Turquia. Uma nova escalada pode prejudicar todos os lados”. Em Atenas, ele acrescentou: “A situação atual no Mediterrâneo Oriental é equivalente a brincar com o fogo. Cada pequena faísca pode levar a uma catástrofe.”

Caças participam de um exercício conjunto entre as forças armadas da Grécia e dos Emirados Árabes Unidos perto da ilha grega de Creta, em 4 de setembro de 2020 [Crédito: Ministério da Defesa da Grécia via AP]

Cem anos atrás, os conflitos nos Bálcãs desencadeados pelo assassinato do arquiduque austríaco Franz Ferdinand em 28 de junho de 1914 levaram ao início da Primeira Guerra Mundial na Europa em 4 de agosto. As potências imperialistas hoje são tão incapazes de deter o impulso para uma conflagração global quanto foram seus ancestrais do século XX.

O renascimento da centenária disputa territorial entre a Grécia e a Turquia está inseparavelmente ligado ao colapso da hegemonia mundial dos EUA, acelerado pela pandemia de COVID-19, e à ruptura da aliança da OTAN entre os EUA e a Europa. Essa ruptura é fruto, em particular, das sangrentas guerras que a OTAN lançou na Líbia e na Síria em 2011 em resposta às revoltas revolucionárias da classe trabalhadora no Egito e na Tunísia. A luta pelos lucros e a vantagem estratégica resultante está dilacerando a OTAN e a região.

Em 2013, nas etapas iniciais da guerra da Síria, o Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS, na sigla em inglês) descreveu o labirinto de conflitos sobre as reservas de petróleo e gás do Mediterrâneo Oriental:

Os recursos de petróleo e gás do Mediterrâneo Oriental estão, no entanto, no coração de uma das regiões mais geopoliticamente complexas do mundo. O conflito entre Israel e Palestina, as tensões entre Israel e Líbano, o conflito congelado em Chipre e as difíceis relações entre a Turquia, a República de Chipre e a Grécia complicam os esforços para desenvolver e vender energia do Mediterrâneo Oriental. A guerra civil síria injetou uma nova fonte de incerteza econômica e geopolítica, enquanto a Rússia, que está em segundo plano, procura entrar na bonança energética do Mediterrâneo Oriental e manter sua posição como o principal fornecedor de petróleo e gás para os mercados europeus.

Esses conflitos são muito mais explosivos hoje do que em 2013. Atenas se sente encorajada a enfrentar Ancara com o apoio da França, embora a Turquia tenha oito vezes a população da Grécia e um exército maior.

Paris está furiosa com o apoio turco ao Governo de Acordo Nacional (GAN) islâmico na Líbia contra o representante da França na Líbia, o Exército Nacional Líbio (ENL) do senhor de guerra Khalifa Haftar. A França vê a política da Turquia como uma ameaça intolerável a seus interesses em seu antigo império colonial africano. Tem procurado unir os outros apoiadores de Haftar, especialmente o Egito e os Emirados Árabes Unidos (EAU), em uma aliança regional com a Grécia contra a Turquia. A posição territorial da Síria no Mediterrâneo Oriental também envolve inevitavelmente seus aliados, Rússia e Irã.

O fracasso das guerras do Oriente Médio lideradas pelos Estados Unidos nos últimos 30 anos, desde a dissolução stalinista da União Soviética em 1991, que eliminou o principal contrapeso político-militar da OTAN, está levando rapidamente a uma nova guerra global. A política da França contra a Turquia reflete a determinação frequentemente manifestada pelas potências da União Europeia (UE) de formular uma política externa independente de Washington. Isso envolve uma afirmação dos interesses imperialistas europeus contra Washington, que impôs tarifas de guerra comercial e sanções ao comércio com o Irã contra a Europa.

Certamente Washington também está preparando novas guerras, embora em grande parte tenha permanecido em silêncio a respeito do conflito entre Grécia e Turquia em meio a greves e protestos sociais cada vez maiores contra a brutalidade policial e a pandemia nos EUA, além das tensões explosivas nas eleições presidenciais. Não há dúvida, entretanto, que Washington está monitorando a política da UE no Mediterrâneo e planejando suas próprias guerras.

No ano passado, em 20 de junho, Trump interrompeu ataques aéreos de grande escala contra o Irã apenas 10 minutos antes de serem lançados. Em um discurso quatro meses depois, o embaixador dos EUA na Grécia, Geoffrey Pyatt, enfatizou o significado global do Mediterrâneo Oriental, declarando: “Em uma era de renovada competição entre grandes potências e as maiores descobertas de hidrocarbonetos da última década, esta encruzilhada global da Europa, Ásia e África voltou à linha de frente do pensamento estratégico dos EUA. Depois de anos sem dar a devida importância ao Mediterrâneo Oriental, os Estados Unidos recuaram para olhar de forma ponderada e abrangente, do ponto de vista do governo, para os interesses dos EUA...”

A história mostra que tais conflitos não podem ser resolvidos pacificamente sob o capitalismo, quer um acordo temporário de paz entre a Grécia e a Turquia seja ou não alcançado de alguma forma. O colapso da hegemonia dos EUA e a mudança do centro de gravidade da indústria global para o Oriente, em direção a países como Turquia e China, fazem emergir em um nível sem precedentes as contradições do capitalismo que os grandes marxistas do século XX identificaram como as causas do início da guerra mundial em 1914: entre a economia mundial e o sistema de Estado-nação, e entre a produção socializada e a propriedade privada dos meios de produção. O conflito no Mediterrâneo Oriental é um alerta para o estágio avançado do impulso imperialista a uma nova guerra mundial.

Os perigos não devem ser subestimados. Não há disposição entre os trabalhadores da Grécia, Turquia, França ou outros países da UE para uma guerra, muito menos uma que possa se transformar em um conflito global. Há uma oposição explosiva na classe trabalhadora estadunidense contra a guerra, assim como um apoio crescente ao socialismo. Como os governos capitalistas em todo o mundo enfrentam uma oposição social crescente e contradições econômicas e geopolíticas internacionais incontroláveis, para as quais não têm soluções, o perigo de que eles possam lançar tal guerra, e conduzi-la a um conflito global catastrófico, é muito real.

Entretanto, os últimos dois anos também testemunharam uma histórica erupção global da luta de classes. Greves e protestos surgiram entre professores e trabalhadores da indústria automotiva estadunidense, com protestos mundiais contra a violência policial nos EUA, além de movimentos em toda a Europa, como a greve nacional de professores na Polônia, a greve de enfermeiros em Portugal e os protestos dos “coletes amarelos” na França. Manifestações contra os governos estouraram em toda a América Latina, na Índia e particularmente em países ao redor do Mediterrâneo, com protestos no Iraque, Líbano, Sudão e Argélia. Ordens de volta ao trabalho e de volta às aulas impostas como parte de uma estratégia brutal de “imunidade de rebanho” em meio à pandemia intensificam as tensões de classe em todos os países.

O que deteve a Primeira Guerra Mundial depois de ter se iniciado nos Bálcãs, um século atrás, foi a tomada do poder pela classe trabalhadora russa, liderada pelo Partido Bolchevique de Vladimir Lenin e Leon Trotsky na Revolução de Outubro de 1917, e a formação da Internacional Comunista para liderar a classe trabalhadora em uma luta revolucionária contra o capitalismo e a guerra imperialista. O defensor desta perspectiva estratégica hoje é o Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI), o movimento trotskista mundial. Somente uma mobilização política internacional e independente da classe trabalhadora contra o capitalismo, para tomar o poder do Estado e construir o socialismo, pode deter o impulso à guerra.

Contra a guerra, é necessário voltar-se ao movimento da classe trabalhadora internacional que está em curso e lutar para armá-la com a consciência marxista para construir um movimento internacional antiguerra e anti-imperialista na classe trabalhadora.

As raízes históricas e políticas da disputa entre a Grécia e a Turquia pelos direitos de exploração de petróleo

Os conflitos entre a Grécia e a Turquia sobre as fronteiras marítimas e os seus recursos naturais estão enraizados nos problemas não resolvidos do século XX. O Tratado de Lausanne de 1923 estabeleceu fronteiras terrestres entre a Grécia e a Turquia. Este evento e os conflitos subsequentes na região ressaltam o caráter invariavelmente reacionário das tentativas de dividir os Bálcãs e o Oriente Médio em fronteiras de Estados nacionais arbitrárias ditadas pelo imperialismo.

A guerra de independência turca de 1919-1922, travada pelo Movimento Nacional Turco de Mustafa Kemal Ataturk, derrotou as tentativas do imperialismo britânico e francês de dividir o território da Anatólia do Império Otomano depois que este foi derrotado junto com a Alemanha e a Áustria na Primeira Guerra Mundial. No acordo Sykes-Picot de 1916 – exposto perante o mundo pelo governo soviético em novembro de 1917 – Londres e Paris concordaram em conquistar e criar o Iraque e a Síria. Eles então atacaram o território atual da Turquia, ao qual a Grécia se juntou em 1919, para dividir os restos do Império Otomano.

Contra a ocupação colonial liderada pelos imperialistas na Turquia, a Rússia soviética apoiou corretamente a resistência nacional turca, que teve forte apoio entre trabalhadores e camponeses, fornecendo armas e apoio ao governo de Ancara. A necessidade militar urgente também ditou a política soviética: Londres e Paris, juntamente com Berlim, Praga, Tóquio e Washington, tinham invadido a União Soviética, apoiando o Exército Branco contrarrevolucionário na Guerra Civil Russa, numa tentativa de esmagar o Estado operário nascente e restaurar um regime Branco neocolonial e antissemita na Rússia. Os comunistas gregos lutaram para mobilizar os soldados gregos contra a ocupação grega em territórios da Anatólia.

Isto não implicava, porém, que os trabalhadores devessem apoiar o Estado burguês turco, que procurava exterminar os comunistas turcos e pisotear os direitos culturais e políticos do povo curdo, nem apoiar as fronteiras que haviam sido acordadas com o imperialismo. A imposição destas fronteiras implicou em horríveis deportações forçadas de 1,6 milhão de pessoas em 1923, numa tentativa de estabelecer Estados etnicamente puros gregos e turcos. Antes de sua degeneração stalinista, o governo soviético ainda baseava sua política na perspectiva de uma revolução socialista internacional que lançaria as bases para o enfraquecimento das fronteiras nacionais dentro de uma federação socialista mundial.

No entanto, as fronteiras marítimas entre a Grécia e a Turquia nunca foram estabelecidas mesmo depois que ambos os países aderiram à aliança antissoviética da OTAN, liderada pelos EUA, após a Segunda Guerra Mundial. A Grécia manteve ilhas espalhadas ao longo dos mares Egeu e Mediterrâneo, muitas vezes a alguns quilômetros da costa turca, tornando o estabelecimento de um limite marítimo polêmico e impossível na prática.

Uma disputa prolongada também surgiu sobre Chipre, a ilha estrategicamente localizada ao largo do litoral da Grécia, Turquia, Líbano e Síria. O conflito explodiu em 1974, quando um golpe liderado por uma junta de coronéis na Grécia e apoiado pela CIA colocou no poder um político cipriota grego de extrema-direita, Nikos Sampson, infame por seus ataques aos cipriotas turcos. O exército turco invadiu Chipre, levando à divisão da ilha desde então e à queda da junta grega. Washington e as potências da UE apoiaram a junta grega, porém, e não reconhecem o enclave cipriota turco.

O que desencadeou as atuais tensões militares entre a Grécia e a Turquia, no Mediterrâneo, são conflitos internacionais ligados às sangrentas guerras da OTAN na Líbia e na Síria. Tendo enfrentado revoltas revolucionárias da classe trabalhadora em janeiro e fevereiro de 2011, que derrubaram o presidente tunisino Zine El Abedine Bin Ali e o presidente egípcio Hosni Mubarak, a França, o Reino Unido e os Estados Unidos lançaram uma guerra por procuração na Líbia contra o regime do coronel Muammar Kadhafi. O regime do Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP) islâmico do presidente turco Recep Tayyip Erdoğan, após breve protesto contra as guerras, voltou-se para apoiá-las.

Essas guerras tiveram amplas e imprevisíveis consequências. Armando milícias islâmicas e tribais na Líbia e bombardeando o país para fornecer apoio aéreo, as potências da OTAN destruíram o governo líbio em seis meses. Com o início de uma guerra civil entre milícias rivais da Líbia, muitos combatentes islâmicos também foram lutar pela mudança de regime na Síria, principalmente através da Turquia. Apesar de bilhões de dólares de apoio da CIA e dos xeiques petrolíferos do Golfo Pérsico, estas pequenas e impopulares milícias islâmicas sunitas não conseguiram derrubar o maior e mais bem armado regime sírio. Em 2015, após a intervenção de forças iranianas e depois russas para apoiar o regime sírio, as forças islâmicas por procuração da OTAN começaram a ser derrotadas.

O fato de Washington, Paris e outras potências da OTAN utilizarem milícias curdas na Síria como forças por procuração levou a uma ruptura nas relações entre a Turquia e as potências imperialistas. Ancara, seguindo sua tradicional hostilidade ao sentimento nacionalista curdo dentro da Turquia, se opôs cada vez mais à política dos EUA e da Europa na Síria. Após abater um caça russo sobre a Síria em novembro de 2015, quase provocando uma guerra, buscou então melhorar as relações com Moscou. Washington e Berlim retaliaram com uma tentativa de golpe em julho de 2016 para assassinar Erdoğan. Tendo o golpe fracassado, Erdoğan continuou no poder desiludido com seus supostos aliados da OTAN.

A dependência da OTAN em relação a forças islâmicas e forças da Irmandade Muçulmana (IM) após a revolução egípcia também levou a conflitos amargos em toda a região. Em meio a enormes protestos da classe trabalhadora no Egito, o regime militar se restabeleceu através de um golpe de Estado em 2013 liderado pelo general Abdel Fattah al-Sisi contra o presidente islâmico Mohamed Mursi, que também massacrou os apoiadores da IM. Como os xeiques petrolíferos do Golfo Pérsico da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos (EAU), que não toleram a IM ou qualquer grupo islâmico dissidente dentro de suas fronteiras, a junta egípcia foi profundamente hostil ao GAN islâmico na Líbia. Sua hostilidade se estende ao AKP islâmico na Turquia, que é um aliado da IM e denunciou o regime de al-Sisi no Egito.

As potências imperialistas levaram a guerra na Líbia não apenas ao leste, na Síria, mas também ao sul, na África subsaariana. Em meio ao seu antigo império colonial, o imperialismo francês interveio na Costa do Marfim para derrubar o presidente Laurent Gbagbo, enviou tropas para a República Centro-Africana e lançou em 2013 uma guerra no Mali contra as milícias islâmicas no norte do país. Por isso – e para defender os interesses de sua companhia petrolífera, a Total, contra o GAN na Líbia e a rival empresa de energia italiana ENI –, Paris também apoiou Haftar na Líbia.

Neste contexto internacional explosivo, as etapas finais das negociações sobre o projeto do gasoduto EastMed, entre Israel, Chipre e Grécia, para transportar gás para a Europa via Grécia e Itália no ano passado provocaram uma reação dura por parte da Turquia. Em agosto, Erdoğan divulgou um mapa da “pátria azul” que reivindicava grandes porções do Mar Egeu. Em novembro, após um acordo marítimo e militar bilateral com o GAN da Líbia, a Turquia reivindicou direitos de exploração conjunta no Mediterrâneo Oriental e, em dezembro, iniciou essas explorações. Atenas respondeu expulsando o embaixador do GAN da Grécia, enquanto a França e a Itália anunciaram que enviariam navios de guerra a Chipre e à ilha grega de Creta para defendê-los contra a Turquia.

A assinatura do acordo do gasoduto Israel-Chipre-Grécia em 2 de janeiro levou a uma nova escalada do conflito em toda a região. A Turquia retaliou anunciando que enviaria tropas para apoiar o GAN contra a ofensiva da Haftar em Trípoli. Isso fez os governos francês e egípcio condenar as ações da Turquia. Nos bastidores da conferência de Berlim, realizada no início do ano e que aprovou uma missão militar da UE na Líbia, França e Grécia anunciaram uma aliança militar formal.

Em abril, as forças turcas na Líbia intervieram para esmagar o avanço do ENL sobre Trípoli e forçou-o a abandonar grande parte do oeste da Líbia. Em maio, a Turquia anunciou planos para realizar perfurações em busca de petróleo próximo às ilhas gregas de Creta, Cárpatos e Rodes.

A situação se agravou rapidamente neste verão. Em junho, quando a fragata francesa Courbet tentou parar navios de carga turcos que navegavam para a Líbia, os navios de guerra turcos apontaram brevemente seus radares de mira para a fragata, indicando que estavam prontos para abrir fogo. A junta egípcia declarou então que estava preparando planos para uma invasão completa da Líbia, que foram adotados em julho. No início de julho, aviões de guerra não identificados, supostamente caças franceses Rafale ou dos EAU, bombardearam a base aérea de Watiya na Líbia, destruindo importantes instalações de radar e ferindo oficiais da inteligência turca.

A Grécia também começou a negociar acordos para o estabelecimento de uma Zona Econômica Exclusiva (ZEE) nas fronteiras marítimas com a Itália e o Egito, o que fez com que Atenas começasse a fazer o mesmo com Ancara. Entretanto, as autoridades turcas rejeitaram tais negociações, pois a Convenção das Nações Unidas sobre Leis do Mar, que a Turquia não reconhece, permitiria à Grécia exigir uma zona de 12 milhas ao redor de cada uma de suas ilhas espalhadas pelo mar Egeu. Isso transformaria praticamente todo o Egeu em águas territoriais gregas, permitindo Atenas bloquear o comércio com destino a Istambul e às principais cidades do norte da Turquia.

Após a Turquia anunciar em 21 de julho que enviaria o navio de exploração Oruç Reis escoltado por 12 navios de guerra para as águas da ilha grega de Kastelorizo, Atenas colocou os militares gregos em alerta total. Mensagens de texto falsas na Grécia alegando serem do Ministério da Defesa e chamando a população a “se mobilizar” para um “incidente militar” causaram pânico. No final das contas, um confronto só foi evitado por uma ligação da chanceler alemã Angela Merkel para Ancara, e então os navios turcos se afastaram da área disputada.

Em agosto, quando navios de guerra gregos e turcos intensificaram as patrulhas – em uma situação, um navio grego abriu fogo contra um barco turco, ferindo três pessoas –, Paris intensificou sua campanha, realizando exercícios navais conjuntos com o Egito e depois com a Grécia e enviando, junto com os EAU, caças para a Grécia. O presidente francês Emmanuel Macron anunciou que iria traçar “linhas vermelhas” contra a Turquia, ameaçando-a com uma guerra. Agora, a pedido de Paris, a UE concordou em preparar sanções econômicas para tentar estrangular a Turquia.

A classe trabalhadora não pode apoiar nenhum dos governos capitalistas que lideram esta perigosa escalada.

Paris, ao mesmo tempo em que se dedica à retórica do direito internacional, defende seus interesses imperialistas e seus lucros petrolíferos em sua antiga esfera colonial. A França continua com seu papel de liderança que desempenhou na pressão pela guerra na Líbia, que terminou na devastação do país e na construção de campos de detenção da UE, onde grupos de direitos humanos relataram que os refugiados são escravizados, estuprados e assassinados. Estes eventos, e não os discursos de Macron, um ex-banqueiro de investimentos, revelam o conteúdo político da retórica imperialista sobre o direito e os direitos humanos.

Uma força-chave que impulsiona a política de Macron é o medo e a raiva diante do contínuo ressurgimento internacional da luta de classes – um medo agora intensificado pelo aumento da raiva da classe trabalhadora diante da pandemia. Tendo reprimido brutalmente os protestos no país, como o movimento dos “coletes amarelos” e a greve do transporte público deste ano, Macron também é violentamente hostil ao movimento que se desenvolve entre os trabalhadores das antigas colônias francesas oprimidas pelo imperialismo.

No ano passado, milhões realizaram protestos contra o governo no Líbano e na Argélia, enormes protestos contra a saída de Gbagbo na Costa do Marfim, e greves e protestos no Mali contra a guerra francesa. As críticas verbais de Erdoğan a Paris por sua arrogância imperialista enfurecem as autoridades francesas. Macron, que em sua visita ao Líbano no mês passado, após a explosão do porto, falou com aqueles que encontrou sobre o antigo chefe colonial francês do país, o general Henri Gouraud, está determinado a legitimar o colonialismo francês e continuar o saque imperialista da África e do Oriente Médio.

O governo de direita do primeiro-ministro grego Kyriakos Mitsotakis foi eleito por falta de opção no ano passado, quando os eleitores tiraram do poder o governo do Syriza (“Coalizão da Esquerda Radical”). O Syriza, um partido de classe média baseado na fusão do stalinismo e da política de identidade, realizou uma traição política impressionante: eleito prometendo acabar com a austeridade da UE, pisoteou os repetidos votos do povo grego contra a austeridade, impondo o maior pacote de cortes sociais da história grega, enquanto construía uma rede de campos de detenção miseráveis da UE para refugiados.

Para contornar o histórico de direita do Syriza, enquanto continua com sua política de austeridade, Mitsotakis tem se apoiado em políticas de Estado policial, em medidas anti-imigrantes e no nacionalismo antiturco. As forças de segurança gregas trabalharam com membros fascistas da Aurora Dourada para bater e atirar nos refugiados do Oriente Médio que cruzavam a fronteira greco-turca. Mitsotakis incluiu em seu gabinete muitos simpatizantes bem conhecidos da junta grega, incluindo o ministro do Desenvolvimento Adonis Georgiadis e o ministro da Agricultura Makis Voridis. É daí que vem, inevitavelmente, a política militarista e antiturca.

O governo do presidente turco Recep Tayyip Erdoğan procura com sua política agressiva de sondagem para a exploração de petróleo assegurar os interesses da burguesia turca, que depende de petróleo e gás importados, e compensar seu colapso nas urnas. A raiva dos trabalhadores está aumentando por causa da política brutal de retorno ao trabalho em meio à pandemia de COVID-19, da queda do poder aquisitivo e das contínuas guerras no Oriente Médio. Dentro de certos limites, Erdoğan acolhe favoravelmente as críticas da UE, permitindo que se faça passar por anti-imperialista, estimule o nacionalismo turco e reprima o crescente conflito de classes na Turquia.

O histórico do governo Erdoğan confirma a Teoria da Revolução Permanente de Leon Trotsky: em países de desenvolvimento capitalista tardio, a burguesia é incapaz de estabelecer direitos democráticos ou de se opor contra o imperialismo. Um regime burguês reacionário manobrando entre várias grandes potências, as políticas do governo Erdoğan têm levado apenas ao desastre. Ele se adaptou às guerras imperialistas na Líbia e na Síria, continuando a opressão do povo curdo dentro da Turquia e adotando uma estratégia assassina de “imunidade de rebanho” na pandemia de COVID-19. A luta contra a guerra e em defesa da vida, da subsistência e dos direitos democráticos dos trabalhadores e dos setores oprimidos da classe média depende da unificação internacional das lutas da classe trabalhadora, que arraste atrás de si as outras classes oprimidas, em uma luta revolucionária pelo socialismo.

O desdobramento da hegemonia mundial do imperialismo dos EUA

O perigo de guerra no Mediterrâneo Oriental confirma os alertas e análises que o Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI) tem feito ao longo de décadas. O CIQI há muito enfatizou que as insolúveis contradições geopolíticas da sociedade capitalista na era da globalização colocariam novamente diante de bilhões de trabalhadores a alternativa da guerra mundial ou da revolução socialista mundial. A dissolução stalinista da União Soviética em 1991 confirmou os alertas de Trotsky sobre a natureza contrarrevolucionária da teoria nacionalista do “socialismo em um só país” de Stalin. No entanto, ela não resolveu as contradições do capitalismo que haviam levado ao início da Primeira Guerra Mundial e à Revolução Russa, nem pôs um fim à era da revolução socialista mundial iniciada em outubro de 1917.

Analisando a guerra da OTAN de 1999 na Sérvia e os bombardeios no Iraque, o presidente do Conselho Editorial do WSWS, David North, apontou o significado dos explosivos conflitos geopolíticos desencadeados pela restauração stalinista do capitalismo na União Soviética e na Europa do Leste. Ele escreveu:

Assim como o desenvolvimento do imperialismo testemunhou os esforços das grandes potências para repartir o mundo no final do século passado, também o desmantelamento da URSS criou um vácuo de poder na Europa do Leste, Rússia e Ásia Central que torna inevitável uma nova divisão do mundo. O principal significado da Iugoslávia, neste momento crítico, é que se encontra na periferia ocidental de uma enorme faixa territorial na qual as grandes potências mundiais pretendem se expandir. É impossível para os EUA, Alemanha, Japão, França, Reino Unido e as outras potências simplesmente olhar passivamente para a abertura desta área. Está se desenvolvendo uma luta pelo acesso à região e pelo controle sobre suas matérias-primas, mão de obra e mercados que superará em muito a “luta pela África” do século passado.

Alertando para “uma série de guerras futuras”, North observou que “o potencial para um conflito com a Rússia tem realmente aumentado”, e o impacto do desaparecimento da União Soviética como o inimigo comum que une o imperialismo dos EUA e europeu: “A burguesia europeia não se contentará em aceitar para sempre uma posição subordinada aos EUA. Sua posição seria continuamente corroída à medida que os EUA procurassem pressionar sua vantagem.”

North também chamou a atenção para as implicações da restauração stalinista do capitalismo na China, e o crescimento industrial da China baseado no acesso aos mercados mundiais e à tecnologia moderna: “O conflito aberto entre os EUA e a China é inevitável. Um país historicamente oprimido, não uma potência imperialista, a China está bem encaminhada para a restauração do capitalismo: aspira ser uma grande potência econômica regional. Tal desenvolvimento, como revela a atual histeria antichinesa nos jornais dos EUA, é veementemente combatida por um setor significativo da elite dominante estadunidense.”

O complexo emaranhado de guerras e conflitos em torno da disputa do Mediterrâneo Oriental reflete o estado extremamente avançado da crise analisada pelo CIQI há duas décadas. A tentativa do imperialismo dos EUA de compensar seu declínio econômico e social usando a força militar – em um amplo arco que vai dos Bálcãs e do Norte da África através do Oriente Médio até a Ásia Central – fracassou.

As guerras imperialistas lançadas no Afeganistão (2001), Iraque (2003), Líbia e Síria (2011) terminaram em desastre. Travadas pela dominação mundial, mas vendidas ao público com mentiras – como uma guerra ao terror islâmico, uma caça às inexistentes “armas iraquianas de destruição em massa” e um apoio a uma revolução democrática no Oriente Médio –, elas desacreditaram o establishment político. Dezenas de milhões de pessoas participaram de protestos mundiais contra a guerra do Iraque em 2002-2003. Desde então, essas guerras causaram milhões de mortes e forçaram dezenas de milhões de pessoas a fugir de suas casas.

Essas guerras prepararam o terreno para um colapso da aliança da OTAN e o impulso para uma nova guerra mundial. Na Europa e no Oriente Médio, o imperialismo estadunidense enfrenta grandes potências rivais. Na Europa, a Alemanha anunciou a remilitarização de sua política externa em 2014, pela primeira vez desde a queda do regime nazista no final da Segunda Guerra Mundial. Desde 2016, quando o Brexit impediu Londres de vetar seus planos, Berlim e Paris se comprometeram repetidamente a projetar uma política militar da UE independente de Washington.

Na costa do Mediterrâneo e em todo o Oriente Médio, Washington enfrenta agora a consolidada oposição de uma grande potência. Suas guerras fortaleceram regimes pró-iranianos no Iraque e na Síria, que também é apoiada pela Rússia.

A China, que Washington identificou como seu maior rival global, também é cada vez mais influente. Como sua Iniciativa do Cinturão e Rota (ICR) desenvolveu projetos de energia, infraestrutura e industriais em todo o Oriente Médio, a China surgiu como o maior parceiro comercial em países como Irã, Iraque, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos. Em julho, segundo informações, ofereceu ao Irã um tratado envolvendo US$ 400 bilhões em investimentos e garantias de defesa mútua em caso de ataque dos EUA.

Isto representa um retrocesso decisivo para a política externa imperialista dos EUA, tal como seus principais estrategistas a formularam nos anos 1990. Em 1997, o ex-conselheiro de Segurança Nacional dos EUA Zbigniew Brzezinski chamou a Eurásia de “o supercontinente axial do mundo” e afirmou: “O que acontece com a distribuição do poder sobre a massa terrestre eurasiática será de importância decisiva para a primazia global e o legado histórico dos EUA... Em uma Eurásia volátil, a tarefa imediata é assegurar que nenhum Estado ou combinação de Estados ganhe a capacidade de expulsar os Estados Unidos ou mesmo diminuir seu papel decisivo.”

Enquanto a aliança da OTAN se desfaz agora no Mediterrâneo Oriental, o imperialismo dos EUA vê inimigos e rivais potenciais espalhados pela massa terrestre eurasiática, inclusive dentro da própria OTAN.

Estes conflitos extraordinariamente agudos impedem qualquer resolução pacífica e de longo prazo da crise do Mediterrâneo Oriental pela OTAN. Quando o Ministro das Relações Exteriores alemão Heiko Maas se dirigiu a uma reunião de autoridades francesas após seu retorno de Atenas e Ancara, ele declarou: “Os Estados Unidos olham para o resto do mundo cada vez mais diretamente através da lente de sua rivalidade com a China... A prontidão dos EUA para desempenhar o papel de uma potência global garantindo a estabilidade tem diminuído.”

Como o movimento marxista insistiu após o início da Primeira Guerra Mundial, a responsabilidade pelo perigo de guerra não recai sobre um ou outro Estado ou político imperialista, por mais agressivo que seja, mas sobre o sistema capitalista de Estado-nação como um todo. O imperialismo europeu não é uma alternativa à falência do imperialismo dos EUA. De fato, a tentativa inicial de Paris e Berlim de operar sua própria política externa no Mediterrâneo desencadeou rapidamente um conflito explosivo. Também não há qualquer garantia de que os interesses do imperialismo alemão e francês, que lutaram entre si em duas guerras mundiais no século passado, serão compatíveis à medida que se propuserem a saquear porções cada vez maiores do globo.

O papel pró-guerra dos partidos pequeno-burgueses

A única maneira de deter o impulso das potências capitalistas rumo a uma nova guerra mundial é a unificação internacional das lutas da classe trabalhadora contra a guerra, a pandemia e o capitalismo a partir de um programa socialista revolucionário. O crescimento da luta de classes internacional desde 2018 e a crescente popularidade do socialismo entre trabalhadores e jovens mostra que a base de tal política existe na situação objetiva. O principal obstáculo continua sendo a crise da direção revolucionária na classe trabalhadora.

Mesmo quando os trabalhadores se levantam em luta independentemente ou contra sindicatos e partidos existentes, eles ainda enfrentam a influência restante dos partidos da pseudoesquerda de classe média alta. Estas forças, baseadas na fusão do stalinismo e da política de identidade, se opõem conscientemente à revolução e procuram ligar os trabalhadores ao sistema capitalista de Estado-nação. Durante as enormes revoltas da revolução egípcia entre 2011 e 2013, elas fizeram propaganda para que os trabalhadores apoiassem qualquer fração da burguesia egípcia – primeiro uma junta militar, depois a Irmandade Mulçumana e finalmente a ditadura de Sisi – que estava se preparando para tomar o poder. Isto finalmente levou, em 2013, à consolidação da ditadura militar de Sisi e ao esmagamento da revolta dos trabalhadores egípcios.

Agora eles estão trabalhando para atrelar os trabalhadores na Grécia e na Turquia ao esforço de guerra, exigindo que eles apoiem os governos nacionais e as forças armadas de cada país. O exemplo mais marcante é o Syriza na Grécia. Uma coalizão entre frações do stalinista Partido Comunista Grego (KKE) e movimentos antiglobalização baseados no movimento estudantil de classe média pós-1968, o Syriza apoia agressivamente a linha militarista do governo Mitsotakis.

Na Grécia, o líder do Syriza e ex-primeiro-ministro Alexis Tsipras reagiu ao impasse no Mediterrâneo Oriental com um apelo chauvinista para uma mobilização dos militares gregos contra os navios turcos: “A forma como essas atividades sísmicas ilegais devem e podem ser evitadas é conhecida de nossas Forças Armadas desde outubro de 2018, quando elas efetivamente realizaram isso. Temos plena confiança em suas capacidades.”

O próprio KKE conseguiu superar os comentários chauvinistas de Tsipras, pedindo uma “postura patriótica” em defesa dos interesses nacionais gregos e denunciando o “cosmopolitismo”. Segundo o partido, “Todos devemos colocar em primeiro lugar a Grécia dos trabalhadores, agricultores, comerciantes e profissionais liberais em dificuldade, cientistas, homens e mulheres, os jovens e aposentados. E não a Grécia dos monopólios, cosmopolitismo, grande capital e seus manipuladores políticos, que vêm de muitas formas.”

Em uma declaração conjunta, o KKE e o stalinista Partido Comunista da Turquia (TKP) se manifestaram em apoio ao Tratado de Lausanne e ao sistema capitalista de Estado-nação nos Bálcãs. Eles declaram que são “contra as violações de fronteiras e o questionamento dos tratados internacionais que definiram as fronteiras na região”, e “contra a mudança de fronteiras e os tratados que as definem”. Isto significa que o KKE e o TKP rejeitam uma luta para unificar os trabalhadores através destas fronteiras e se acomodam às guerras e intrigas imperialistas que sustentam os tratados internacionais. Isto também significa que o KKE e o TKP hoje estariam do lado do Estado capitalista um contra o outro em caso de guerra.

Na Turquia, o Partido Republicano do Povo (CHP) de oposição, o partido tradicional da classe dominante turca, apoiou a política do governo do presidente Erdoğan sobre o Mediterrâneo Oriental. O líder do CHP, Kemal Kılıçdaroğlu, declarou anteriormente, a respeito das disputadas ilhas do Mar Egeu mantidas pela Grécia: “Vou apreender todas essas ilhas”. Entretanto, um grupo de partidos incluindo o Partido de Esquerda (antigo Partido da Liberdade e Solidariedade – ÖDP, na sigla original), o Partido Trabalhista (EMEP) e o Partido dos Trabalhadores da Turquia (TİP), estão orientados e apoiam o CHP, tendo apoiando os candidatos a prefeito do CHP nas eleições municipais do ano passado.

O nacionalista curdo Partido Democrático Popular (HDP), que também apoia o CHP como um mal menor contra Erdoğan, publicou uma declaração dizendo que todos os recursos naturais da região “ao redor da Ilha de Chipre pertencem aos povos cipriotas turcos e gregos, e esses recursos devem ser utilizados por eles juntos e simultaneamente”. Levando em consideração as propostas de negociação entre cipriotas gregos e cipriotas turcos, apelou para “manterem abertos todos os canais políticos, diplomáticos e legais de diálogo”.

A declaração do HDP exemplifica a falência do nacionalismo burguês curdo. Seus aliados dentro da Síria têm funcionado como forças por procuração dos EUA, da França e de outras potências imperialistas. Dentro da Turquia, ele busca alianças com partidos burgueses reacionários como o CHP, que são hostis aos direitos democráticos do povo curdo e orientados para a UE. Estas políticas refletem a rejeição do HDP de uma orientação para a classe trabalhadora internacional: ele não tem nada a propor quando as tensões de guerra aumentam, mesmo quando todos os canais diplomáticos são mantidos abertos, porque as diferentes potências imperialistas e capitalistas para as quais o HDP se orientou estão levando à guerra umas contra as outras.

Na França, o Novo Partido Anticapitalista (NPA) e o partido A França Insubmissa (LFI) de Jean-Luc Mélenchon, que é apoiado pelo stalinista Partido Comunista Francês, mantiveram ambos um silêncio ensurdecedor sobre a disputa entre a Grécia e a Turquia. Esses partidos apoiaram entusiasticamente a guerra da Líbia quando a OTAN a lançou pela primeira vez em 2011. O porta-voz do NPA, Olivier Besancenot, liderou os apelos para que Paris armasse os “rebeldes” líbios. O LFI, que tem laços estreitos com o corpo de oficiais e os sindicatos policiais, é um partido pró-guerra que apoia a volta do alistamento militar obrigatório na França.

Os elementos deste meio pseudoesquerdista desempenham um papel particularmente reacionário ao procurar atar os trabalhadores a estas organizações nacionalistas, ao mesmo tempo em que se apresentam como internacionalistas. Esta é a função do Partido Revolucionário dos Trabalhadores (DİP), o afiliado turco do Partido Obrero (PO) da Argentina e de seu partido irmão grego, o Partido Revolucionário dos Trabalhadores (EEK) de Savas Michael-Matsas.

A hostilidade deles à classe trabalhadora é reforçada por terem apoiado as promessas eleitorais traiçoeiras do Syriza em janeiro de 2015. O EEK apelou por uma “poderosa Frente Única de todas as organizações populares e de trabalhadores ... do KKE, Syriza, Antarsya ao EEK, as outras organizações de esquerda, movimentos anarquistas e antiautoritários”. No entanto, sabia que o Syriza é um partido pró-capitalista. Para cobrir seus rastros, aconselhou os eleitores a apoiar o Syriza, mas também a “exigir de seus líderes que rompessem com a burguesia, o pessoal político, todos oportunistas e pretendentes ao poder do capital”.

Já o DİP declarou no período que antecedeu as eleições: “Ficaremos muito felizes com a força que a classe operária e os trabalhadores liderados pelo Syriza sairão das eleições”.

Sua declaração conjunta de hoje sobre a disputa entre a Grécia e a Turquia tenta pintar a política nacionalista reacionária do meio pseudoesquerdista com cores internacionalistas. Ela critica a burguesia grega e a turca por não assegurar mais lucros com o petróleo e, em vez disso, deixa que vá para as companhias petrolíferas das grandes potências imperialistas: “O fato é que as classes dominantes de cada país estão oferecendo a maior parte na divisão das riquezas naturais do Mediterrâneo às grandes potências que se fazem passar por seus protetores. Esta é uma luta entre empresas como Total, ENI, Shell, BP e Exxon, não entre os trabalhadores da Grécia e da Turquia!”

Denunciando o Estado israelense por usurpar a riqueza petrolífera mediterrânea de “seus legítimos proprietários, o povo palestino”, conclui com um apelo falido: “Vamos intensificar a guerra de classes contra a guerra! O principal inimigo está dentro de nossos próprios países – os capitalistas gregos e turcos, seus governos e regimes, a serviço de seus patrões imperialistas.”

O EEK e o DİP têm uma longa história de soar os tambores da guerra e se colocar ao lado de sua própria burguesia em tempos de crise. Quando em 2010 Israel atacou o Mavi Marmara, um navio que transportava suprimentos humanitários, matando nove cidadãos turcos, o DİP não apelou para uma mobilização da classe trabalhadora turca, israelense e internacional. Ao contrário, apelou para o governo Erdoğan para “Enviar navios de guerra, recuperar navios de ajuda de Israel!”

A perspectiva do EEK e do DİP é dividir os recursos da região entre os Estados artificiais criados pela divisão imperialista do Império Otomano. Na verdade, é impossível dividir pacificamente os recursos da região entre seus complexos grupos étnicos mesclados, pela mesma razão que é impossível traçar fronteiras para os Estados-nação da região. A região e seus lucros são divididos por guerras imperialistas, nas quais as burguesias das ex-colônias e semicolônias desempenham inevitavelmente um papel subordinado.

A classe trabalhadora não pode atribuir a si mesma a tarefa desesperada e reacionária de realizar uma divisão de lucros e território entre os Estados-nação no lugar da burguesia e criticar a classe capitalista por não defender suficientemente bem os interesses nacionais contra outras nacionalidades. Esta perspectiva falida, defendida pelo EEK e pelo DİP, em todo caso, se desenvolve rapidamente na perspectiva do Syriza e do CHP. Diante do enfrentamento entre as marinhas grega e turca no Mediterrâneo e no Egeu para dividir os lucros do petróleo, essa política significa mobilizar trabalhadores para a guerra em busca de lucros contra o inimigo estrangeiro.

Por um movimento internacional da classe trabalhadora pelo socialismo e contra a guerra

A mentira reacionária de que trabalhadores e soldados na Grécia e na Turquia são inimigos fadados a atirar uns nos outros deve ser rejeitada e combatida. A luta contra a guerra e por um desenvolvimento racional das forças produtivas no Mediterrâneo coloca a classe trabalhadora diante da tarefa de lutar pelo controle das cadeias de suprimentos eurasiáticas e globais contra a pilhagem e a anarquia organizada pela aristocracia financeira. Esta grande luta exige uma ruptura implacável com o sistema de Estado-nação e todos os partidos burgueses e pequeno-burgueses.

Explicando em A Revolução Permanente de 1929 a perspectiva por trás da Revolução de Outubro e da fundação da União Soviética e da Internacional Comunista, Trotsky escreveu:

A revolução socialista não pode realizar-se nos limites nacionais. Uma das razões básicas para a crise na sociedade burguesa reside no fato de as forças produtivas criadas por ela tenderem a ultrapassar a estrutura do Estado nacional. Daí surgem, por um lado, as guerras imperialistas, e, por outro, a utopia dos Estados Unidos burgueses da Europa. A revolução socialista começa no terreno nacional, desdobra-se na arena internacional e se completa na arena mundial. Assim, a revolução socialista torna-se uma revolução permanente no sentido novo e amplo do termo: ela só termina com o triunfo definitivo da nova sociedade em todo o nosso planeta.

Agora é a hora da classe trabalhadora internacional, que tem sido imensamente fortalecida pelas três décadas da globalização da produção. Desde 1980, somente a classe trabalhadora industrial quase quadruplicou, passando de aproximadamente 250 milhões para quase 1 bilhão de seres humanos. No total, a classe trabalhadora cresceu em 1,2 bilhão entre 1980 e 2010. A porcentagem da força de trabalho global composta por camponeses caiu desde 1991 de 44% para 28% à medida que centenas de milhões de pessoas do campo foram para as cidades procurar trabalho.

Espera-se que mais de 1 bilhão de pessoas se junte às fileiras da classe trabalhadora no próximo século, somente na África. O medo da burguesia francesa, em particular nas greves e protestos explosivos em suas antigas colônias na África, está ligado a projeções de que até 2050 85% dos francófonos de todo o mundo poderão viver na África, muitos deles em países de rápida industrialização na África subsaariana. Isto representaria um total de 700 milhões de pessoas, em comparação com a população atual da França de 66,5 milhões, e uma população esperada de 74 milhões em 2050.

A erupção internacional da luta de classes desde 2018 reflete uma raiva política explosiva em níveis assombrosos de desigualdade social e violência policial-militar produzida pelo capitalismo. A onda de enormes protestos e lutas de classe, inclusive em dezenas de antigos países coloniais e semicoloniais, também reflete a força crescente da classe trabalhadora internacional e das forças produtivas criadas pela indústria e economia do século XXI.

A unificação das forças titânicas da classe trabalhadora internacional em uma luta socialista contra a guerra imperialista e o capitalismo é a grande tarefa colocada pela disputa no Mediterrâneo. O caminho a seguir é uma luta revolucionária pelos Estados Socialistas Unidos da Europa e os Estados Socialistas Unidos do Oriente Médio, contra a UE e o Tratado de Lausanne, como parte de uma federação socialista mundial. Isto significa em todos os lugares defender a unidade de classe revolucionária com as lutas de trabalhadores de outras nacionalidades contra os apelos pequeno-burgueses à solidariedade nacional com os exploradores capitalistas de cada país.

Além disso, os dois últimos anos da luta de classes confirmaram novamente a grande lição da Revolução de Outubro e do século XX: a classe trabalhadora não pode, por meio de greves espontâneas e protestos, improvisar uma organização internacional e uma estratégia revolucionária contra o capitalismo e a guerra imperialista. A luta pelo internacionalismo e pelo socialismo contra os partidos pequeno-burgueses que buscam reunir trabalhadores por trás de belicistas burgueses em cada país só pode ser travada de forma consciente. Isso requer uma direção política revolucionária na classe trabalhadora. Somente o movimento trotskista pode liderar a luta por uma ruptura com a orientação nacionalista predominante promovida ao longo de décadas pelos partidos stalinistas e nacionalistas burgueses.

Isto requer a construção de seções do CIQI em países do Oriente Médio, Europa e em todo o mundo para unificar o movimento da classe trabalhadora que está em curso em um movimento mundial pelo socialismo. O CIQI faz um chamado a seus apoiadores e aos leitores do World Socialist Web Site para apoiar ativamente, entrar em contato com o CIQI e lutar para construí-lo como a direção revolucionária internacional da classe trabalhadora na luta contra a guerra.

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