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Líder pseudoesquerdista brasileiro Guilherme Boulos busca acomodação política com a extrema-direita

Publicado originalmente em 30 de abril de 2021

Em 18 de abril, Guilherme Boulos, a principal figura da pseudo-esquerda brasileira, realizou uma reunião política privada com o presidente do partido Republicanos, o deputado federal Marcos Pereira.

A liderança dos Republicanos inclui dois filhos do presidente fascistóide brasileiro Jair Bolsonaro, que possuem cargos eletivos - o senador Flávio e o vereador do Rio de Janeiro Carlos - e serve de frente política para os negócios da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD). A IURD é uma igreja neo-pentecostal com sede no Brasil, mas com filiais internacionais, e está firmemente alinhada com a facção de Donald Trump do Partido Republicano dos Estados Unidos.

O líder da IURD, Edir Macedo, é o pregador evangélico mais rico do país, listado pela Forbes como tendo uma fortuna de 2 bilhões de reais (US$ 350 milhões). Ele e seus aliados mais próximos na liderança da IURD enfrentam uma extensa lista de acusações nos EUA, Europa e África, desde lavagem de dinheiro até tráfico de crianças e esterilização forçada de funcionários da igreja.

O objetivo da reunião era assegurar a essas forças fascistóides lideradas pelo Presidente Bolsonaro que eles não têm nada a temer do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) de Boulos, enquanto se preparam para suprimir a oposição da classe trabalhadora.

Pelo contrário, com sua aproximação da extrema-direita, o PSOL está tentando provar que pode ser um fator crítico para evitar o colapso de todo o edifício do regime capitalista brasileiro, diante de uma pandemia descontrolada que está somando 3.000 vítimas por dia a um total de mais de 400.000 mortos. Isto se soma a uma disparada da desigualdade social, com 60% dos brasileiros enfrentando insegurança alimentar e mais de 20 milhões jogados na pobreza, à medida que os bilionários aumentaram sua riqueza em 72% durante o último ano de morte em massa.

Com a promoção do Republicanos e da direita fascistóide como parceiros políticos legítimos dos autoproclamados "socialistas", o PSOL visa desarmar e desorientar a oposição da classe trabalhadora às conspirações fascistóides abertas e crescentes do Presidente Bolsonaro e desviar a oposição em massa, de modo que não represente uma ameaça ao capitalismo como um todo.

Pastor bilionário Edir Macedo e o presidente Jair Bolsonaro (crédito: Alan Santos/PR)

A reunião de Boulos com Pereira tem todas as marcas de uma conspiração política. Ela não foi abordada publicamente nem pelo PSOL nem por Boulos, que deram respostas evasivas quando questionados pela CNN e outros meios de comunicação, afirmando que a discussão apenas mostrou um movimento para "esquerda e evangélicos buscarem se dialogar".

Ao relatar a reunião, a CNN citou assessores de Boulos, segundo os quais ele havia pedido aos aliados ricos nos círculos empresariais de São Paulo para ajudá-lo a "desvencilhar a ideia que a direita tenta lhe impor de que ele pretende, se eleito para algum cargo majoritário, defender a invasão de casas". Por detrás desta explicação desdenhosa e estúpida, está o desejo de Boulos de entrar em negociações a portas fechadas com a direita brasileira com o objetivo de dissipar qualquer associação entre ele e o PSOL e o menor desafio à propriedade privada e ao sistema de lucro capitalista.

Uma versão mais honesta da reunião foi dada pelo próprio líder do Republicanos, Marcos Pereira, dois dias depois, em 21 de abril. Em um artigo no site Poder360, ele elogiou a "inteligência aguçada" de Boulos e afirmou que a conversa lhe "deu ainda mais certeza de que o caminho para um país mais justo e eficiente é a moderação", ou seja, nada deve ser temido em relação ao "socialista" Boulos.

Na medida em que alguma crítica foi levantada no PSOL quanto à reunião, ela se limitou a objeções sobre as conversas tornarem-se de conhecimento público. Sâmia Bomfim, deputada federal pelo PSOL, lamentou o fato de o partido estar dando publicidade ao diálogo. Ela postou uma resposta a uma citação de Boulos nas redes sociais, defendendo a necessidade de "reconstruir pontes entre o povo evangélico e a esquerda", dizendo: "Não entendi porque esta posição está na página do partido. Há muito desconforto na base com o ocorrido e o texto vai parar nas redes oficiais do PSOL?" Longe de uma denúncia de Boulos, a preocupação de Bomfim é que a divulgação de sua postura de abrir os braços para a direita fascistóide minará os esforços do PSOL para agir como um tampão "esquerdista" contra a crescente raiva popular sobre a situação social no Brasil.

Boulos foi elevado à fama internacional por porta-vozes da pseudo-esquerda no ano passado, quando levou o PSOL, um partido com apenas 10 cadeiras entre as 594 do Congresso brasileiro, a receber 40% dos votos e ficar em segundo lugar nas eleições para prefeito na maior cidade do Brasil, São Paulo, superando o Partido dos Trabalhadores (PT) em todos os distritos, com exceção de dois, e quase empatando com o prefeito reeleito Bruno Covas em alguns dos distritos mais ricos da cidade.

Durante as eleições, a pseudo-esquerda internacional, liderada pela revista Jacobin, promoveu Boulos como socialista. A Jacobin publicou um perfil reluzente de Boulos sob o título "A Maior Cidade do Brasil Pode Em Breve Ter um Prefeito Socialista". Ele o descreveu como desafiante à esquerda e "de base" ao PT a partir de 2003, à medida em que as políticas pró-capitalistas do do partido, a corrupção desenfreada e a austeridade brutal provocavam uma deserção dos membros da classe trabalhadora, particularmente de sua juventude.

No centro dos argumentos da Jacobin estava o envolvimento de longa data de Boulos com o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). O MTST é um dos inúmeros "movimentos sociais" da América Latina promovidos durante décadas pelos stalinistas e pablistas. Ele se concentra em ocupar propriedades urbanas ociosas de propriedade de especuladores altamente endividados e pressionar o Estado a entregá-las a gigantes da construção civil para a construção de moradias.

Apesar de alguma fraseologia radical contra "interesses financeiros" e a "especulação fundiária", o MTST sempre atuou como um intermediário para os interesses de lucro do ramo da construção. Ele deu uma cobertura "de esquerda" aos vastos subsídios fornecidos pelo PT aos mesmos monopólios de construção que mais tarde estariam no centro dos escândalos de corrupção supervisionados pelo partido.

A Folha de S. Paulo reconheceu o caráter pró-capitalista do MTST de Boulos, elogiando-o como alguém qualificado para o cargo de prefeito do centro financeiro do Brasil por ter "anos de experiência na liderança de movimentos populares".

Em sua coluna na Folha de S. Paulo um dia após o encontro com o Republicanos, Boulos defendeu seu giro na direção da direita fascistóide, invocando a promoção por stalinistas e nacionalistas de esquerda da "teologia da libertação" na Igreja Católica da América Latina durante a segunda metade do século XX.

Ele retratou cinicamente uma "sociedade deprimida, onde milhões são relegados à humilhação" para afirmar que "há 40 anos, a Igreja Católica teve uma forte experiência de redes de acolhimento com as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs)".

Os membros das CEBs, muitos deles jovens abnegados atraídos pelos stalinistas e pablistas para o beco sem saída da guerrilha, sofreram uma repressão brutal nas mãos das ditaduras latino-americanas em coordenação com a própria Igreja. Setores significativos da liderança do Partido dos Trabalhadores e de suas correntes dissidentes, que mais tarde formariam o PSOL em 2004, foram recrutados desses movimentos à medida em que os stalinistas e os pablistas tentavam deter a maré revolucionária na América Latina com uma miríade de ilusões em nacionalistas burgueses e "marxistas inconscientes". Em 2020, Boulos escolheu como sua companheira de chapa em São Paulo a ex-prefeita do PT Luiza Erundina, uma veterana de 86 anos, ela mesma recrutada do movimento das CEBs, com o objetivo declarado de reavivar essas ilusões religiosas.

Nas décadas de 60 e 70, o giro para as CEBs foi justificado em nome da aproximação de seu caráter de massa, seja no campesinato ou no jovem proletariado que migrava do campo, sob domínio católico. Agora, décadas após o colapso do apoio às CEBs em paralelo com o apoio aos chamados "movimentos sociais", sindicatos e, de modo mais amplo, ao nacionalismo burguês, estas mesmas forças estão se voltando para os falsificadores fascistóides evangélicos e multimilionários, para mais uma vez desviar a classe trabalhadora da luta pelo socialismo.

Tal oscilação em direção a forças fundamentalistas cristãs por parte do PSOL, um partido que promove agressivamente as políticas identitárias raciais e de gênero, pode parecer uma contradição. Ainda mais considerando que no Rio de Janeiro, a principal base eleitoral do PSOL, o partido se aliou ao longo de anos, com base nas políticas identitárias, com os Democratas, o partido sucessor da ARENA, que liderou a ditadura militar, em nome de fazer oposição ao Republicanos. O candidato dos Republicano, o pastor milionário da IURD Marcelo Crivella, venceu as eleições para prefeito do Rio em 2016 derrotando o candidato do PSOL, Marcelo Freixo.

A força motriz por trás da manobra do PSOL é a profunda crise do capitalismo brasileiro. A base social do PSOL na pequena burguesia, embora em conflito com os principais setores da classe dominante brasileira sobre a distribuição da riqueza entre os 10% mais ricos da sociedade, tem mais medo da classe trabalhadora e de um verdadeiro movimento socialista do que dos fascistas. Em última análise, o fundamentalismo cristão da IURD e as política identitárias do PSOL servem ao mesmo objetivo: dividir a classe trabalhadora segundo linhas religiosas, de gênero e raciais e impedir que ela se una em uma luta consciente contra o capitalismo sob uma liderança socialista.

Como o WSWS advertiu durante as últimas eleições, o PSOL está preparando conscientemente o mesmo tipo de traição realizada por seus análogos internacionais, como o Podemos na Espanha, o Syriza na Grécia e o Partido de Esquerda na Alemanha. No caso dos dois últimos, isto significou uma promoção aberta de forças fascistóides, com o Syriza trazendo os ultranacionalistas Gregos Independentes para sua coalizão governamental em 2015, e o Partido de Esquerda formando inúmeras frentes de facto com o neofascista Alternativa para a Alemanha (AfD) em todo o país.

As eleições de 2020 viram o PSOL se adaptar à agitação fascistóide de Bolsonaro, fazendo uma campanha pró-capitalista e militarista, alegando que poderia trazer mais investimentos por ser mais confiável para o capital nacional e internacional. O partido lançou dezenas de policiais como candidatos em todo o país, com Boulos prometendo contratar mais 2.000 guardas municipais em São Paulo, onde concorreu a prefeito. Durante a campanha, Boulos recusou-se a reconhecer a erupção de uma segunda onda da pandemia da COVID-19.

O esforço atual do PSOL de aliar-se à extrema-direita expressa um desenvolvimento lógico, ainda que qualitativo, nesta trajetória política, à medida que o partido cerra fileiras com o Republicanos contra a crescente maré de oposição da classe trabalhadora, encarnada na crescente atividade grevista contra a morte e miséria em massa.

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