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Bolsonaro une atos golpistas a paradas militares no bicentenário da Independência do Brasil

Na quarta-feira, durante a celebração dos 200 anos de Independência do Brasil, o presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores de extrema-direita protagonizaram uma série esperada de manifestações em defesa da instauração de uma ditadura autoritária no país.

Há menos de um mês das eleições presidenciais, para as quais Bolsonaro vem traçando sistematicamente um plano de golpe inspirado nas ações do 6 de janeiro de Donald Trump, este Sete de Setembro marcou um ponto de virada crítico. Nele se viu uma unificação inédita nas ruas dos apoiadores de seu projeto político fascistoide e das forças militares, com anuência dos generais.

Bolsonaro assiste a parada militar em Brasília no 7 de setembro (Crédito: Antonio Cruz/Agência Brasil)

Em diversas cidades, os apoiadores do presidente tomaram as ruas com faixas em defesa de uma intervenção das Forças Armadas contra os demais poderes da república e pela “criminalização do comunismo” no Brasil.

Bolsonaro participou de dois eventos: o primeiro, organizado na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, e o segundo no Rio de Janeiro, onde ocorreu uma parada militar massiva, tradicionalmente não assistida pelos presidentes da república.

O evento oficial em Brasília celebrando o Dia da Independência reuniu lideranças políticas de países com o português como língua oficial, ao lado de representantes dos setores mais reacionários da sociedade brasileira, como os remanescentes ultradireitistas da família real portuguesa que governou o Brasil e empresários investigados por defender um golpe bolsonarista. O presidente de Portugal, o supostamente inclinado à “esquerda” Marcelo Rebelo, posou no evento ao lado de Bolsonaro enquanto este segurava uma bandeira do Brasil com seus dizeres “Ordem e Progresso” substituídos por “Brasil sem Aborto” e “Brasil sem Drogas”.

Também em Brasília, quando falou a apoiadores, o presidente evocou episódios da história brasileira, incluindo o golpe militar de 1964. Comparando-os às eleições atuais ele declarou ameaçadoramente: “A história pode repetir. O bem sempre venceu o mal”. No Rio de Janeiro, fazendo referência ao candidato Lula do PT, favorito nas pesquisas, e a “esquerdistas” em geral, ele alegou que “esse tipo de gente tem que ser extirpado da vida pública”.

As análises na mídia corporativa destacaram a “moderação” do tom de Bolsonaro em relação aos discursos do Sete de Setembro do ano anterior, quando, em manifestações de mesmo caráter golpista, o presidente anunciou “um ultimato para todos que estão nos três poderes”.

As mesmas análises concentraram fogo no caráter “machista” do discurso de Bolsonaro em Brasília, no qual ele evocou um estúpido coro o chamando de “imbrochável”. O Canal Uol, ligado à Folha de São Paulo, entrevistou a deputada Sâmia Bomfim do pseudoesquerdista Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Ela declarou sobre “o aspecto do machismo de Bolsonaro”: “Espero mesmo que ele se arrependa muito de ser assim porque eu acredito que é um dos principais elementos que pode nos fazer derrota-lo nas eleições de outubro”.

Para os elementos da burguesia e da classe média alta que ditam a opinião pública, esse é um motivo mais sério para se opor a Bolsonaro do que o planejamento ativo de um golpe de Estado.

Mas os jornais não puderam ignorar o absoluto sucesso de Bolsonaro em seu objetivo principal: o de diluir qualquer barreira entre as comemorações militares e seus atos políticos fascistoides.

O colunista do Estado de São Paulo, Marcelo Godoy, descreveu os eventos no Rio de Janeiro: “O palanque militar ao lado do Forte de Copacabana foi tomado por apoiadores de Bolsonaro com camisetas verde e amarelo enquanto o locutor acentuava o nome do candidato e o público respondia: ‘Mito!’ O presidente desceu do palanque e foi cumprimentar seus apoiadores enquanto os canhões Exército disparavam suas salvas.

“Tudo debaixo dos olhares de dois integrantes do Alto Comando do Exército, o comandante militar do Leste, general André Luiz Novaes, e o chefe do Departamento de Ensino da Força Terrestre, general Flávio Marques Barbosa, além de oficiais generais da Marinha e da Força Aérea.”

Além das manifestações “em terra”, os apoiadores de Bolsonaro realizaram uma chamada “jet-skiciata” pela praia de Copacabana com navios militares ao fundo. Em fotos, lanchas e jet-skis fazendo campanha por uma ditadura no Brasil posam com os navios de guerra da Marinha dos Estados Unidos enviados para a celebração militar.

Esses desenvolvimentos levam por água abaixo todas as garantias dadas pela mídia, assim como pelos partidos da pseudoesquerda, sobre tanto um suposto “compromisso constitucional” que impediria as Forças Armadas de apoiarem um golpe de Bolsonaro, como uma suposta “defesa da democracia” pelo imperialismo americano.

O analista político da Folha de São Paulo, Igor Gielow, também reconhece que Bolsonaro “sequestrou com eficácia as celebrações do Bicentenário da Independência” e “também os militares”. A partir disso, ele conclui: “Restará saber se, na hipótese de 6 de janeiro bolsonarista, à imagem e semelhança daquele nos EUA de Donald Trump, haverá algum general Mark Milley (chefe do Estado-Maior americano) a dizer não a arbítrios”.

A comparação entre o golpe sendo preparado por Bolsonaro e aquele promovido por Trump nos Estados Unidos é apta. Mas a conclusão de que um tal golpe pode ser evitado por uma espécie de “Mark Milley brasileiro” é ao mesmo tempo falsa e reveladora da falência da política burguesa no Brasil.

Nos Estados Unidos, o Partido Democrata e a mídia corporativa depositaram toda sua confiança na derrota dos esforços golpistas de Trump pelos militares. O general Mark Milley foi declarado pelo New York Times e outros como salvador da democracia americana por ter se distanciado do presidente no momento de sua tentativa de golpe. Mas, como o World Socialist Web Siteanalisou em detalhes, Milley foi instrumental para o avanço dos planos golpistas de Trump até quase o último momento, e seu rompimento se deu pela incerteza do sucesso de tal golpe. Além disso, a intervenção de Milley foi incapaz de prevenir que os apoiadores fascistas de Trump tomassem o edifício do Capitólio por 199 minutos sem qualquer intervenção efetiva policial ou militar.

A confiança depositada pelos democratas americanos nas manobras de bastidores com os militares e o Estado contra as ameaças golpistas de Trump somente permitiu que ele seguisse articulando um movimento fascista de tipo jamais visto nos Estados Unidos, como reconheceu o próprio Biden. Tentativas de Lula e seus satélites da pseudoesquerda de copiar esta receita estão preparando o terreno para uma catástrofe no Brasil.

Os eventos deste Sete de Setembro reforçam o chamado do Grupo Socialista pela Igualdade (GSI) de uma mobilização independente da classe trabalhadora contra as conspirações autoritárias de Bolsonaro e dos militares.

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