Os trabalhadores dos Correios e da Petrobras no Brasil entraram em greve por tempo indeterminado nesta semana depois de rejeitarem os Acordos de Trabalho Coletivo de 2026 propostos por duas das maiores empresas controladas pelo Estado brasileiro.
Como parte de um levante crescente de trabalhadores de todo o mundo nos últimos anos, essas greves são uma continuação de um movimento dos funcionários públicos federais em defesa de seus salários e condições de trabalho desde que o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva (Partido dos Trabalhadores – PT) voltou ao poder em 2023.
Entre as denúncias que os trabalhadores da Petrobras e dos Correios estão fazendo do governo Lula estão suas promessas não cumpridas de reverter os ataques profundos do ex-presidente fascista Jair Bolsonaro (2019-2022). Pelo contrário, ele está continuando esses ataques, incluindo os planos crescentes de privatização dessas empresas.
Em 2020, no segundo ano do governo Bolsonaro, os trabalhadores dos Correios e da Petrobras já tinham realizado as maiores greve desde 1995, quando entraram em luta contra amplas medidas neoliberais de privatização e de ataques aos funcionários públicos do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).
Iniciada em 15 de dezembro, a greve na Petrobras começou com tanta adesão quanto a de 2020 e, desde então, o movimento cresceu. Na quinta-feira, ela atingiu totalmente nove refinarias, 28 plataformas offshore e 13 unidades da Transpetro, responsável pelo transporte e armazenamento de combustíveis, entre outras unidades.
A Petrobras possui cerca de 50 mil funcionários concursados e mais de 100 mil funcionários de empresas terceirizadas. Ao longo deste ano, funcionários concursados e terceirizados já tinham realizado inúmeras paralisações e greves. Protestos regulares de aposentados também têm acontecido contra os descontos do fundo de pensão.
Os trabalhadores da Petrobras estão reivindicando um aumento de 9,8% para recompor os anos em que não tiveram reajuste salarial. A Petrobras ofereceu 5,66%, um valor que, descontada a inflação no último ano, representa um ganho real de apenas 0,5%.
Em contraposição à proposta rebaixada, os trabalhadores também estão denunciando o lucro líquido de R$94 bilhões e os R$37,3 bilhões em dividendos que a Petrobras distribuiu aos acionistas até o terceiro trimestre deste ano.
Essa denúncia se torna ainda mais significativa considerando que o governo Lula manteve a política de pagamento de dividendos iniciada em 2020 pelo governo Bolsonaro. Ele apenas reduziu o percentual de distribuição obrigatória de 60% para 45% do lucro líquido, sob a justificativa de priorizar investimentos na transição energética e em novos projetos de exploração de petróleo e gás.
A greve foi respondida com bastante repressão pela Petrobras. A Federação Única dos Petroleiros (FUP), filiada à CUT controlada pelo PT, denunciou que em 15 de dezembro “houve uma interferência direta da gestão da Petrobras para acionar a PM [Polícia Militar] do Rio de Janeiro contra a greve na Reduc [Refinaria Duque de Caxias]”. Dois trabalhadores acabaram sendo detidos por algumas horas.
A FUP também denunciou que a Petrobras dificultou “a liberação de trabalhadores que aderiram à greve em plataformas e refinarias”.
Desde 16 de dezembro, trabalhadores dos Correios de 12 dos 36 sindicatos regionais, cobrindo nove dos 26 estados brasileiros, estão em greve por melhores salários e condições de trabalho e contra um “plano de reestruturação” da empresa apresentado pelo governo Lula em novembro que irá acelerar seus planos de privatização. Em 23 de dezembro haverá assembleias nos outros sindicatos para decidir a greve.
Estão em greve os trabalhadores dos maiores estados brasileiros, incluindo São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Mostrando uma determinação crescente de luta, os trabalhadores dos estados do Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro votaram por unanimidade pela greve. Em São Paulo, os trabalhadores aprovaram a paralisação contra a orientação da direção do sindicato.
As negociações entre os sindicatos e os Correios começaram em agosto, mas não avançaram. Em 11 de dezembro, os Correios acionaram o Tribunal Superior do Trabalho (TST) para mediar as negociações do no Acordo Coletivo de Trabalho depois de os trabalhadores de São Paulo, o estado mais rico do Brasil e com a maior base de trabalhadores, aprovarem indicativo de greve.
Na reunião de terça-feira mediada pelo TST, a direção dos Correios retirou sua proposta inicial de reajuste zero e propôs aumentar os salários dos trabalhadores pela inflação. Porém, os Correios mantiveram a proposta de implementar a jornada 12x36 (12 horas de trabalho, 36 horas de descanso) e se recusaram a oferecer o benefício de Natal de R$2,5 mil reais.
Os ataques do governo Lula contidos no “plano de reestruturação” contra alegados déficits crescentes dos Correios também se mantêm. Ele prevê o fechamento de mil agências dos Correios e a demissão de 15 mil dos 83 mil funcionários da empresa por meio de um Plano de Demissão Voluntária (PDV).
Como parte desse plano, cinco bancos brasileiros, dois deles controlados pelo Governo Federal, anunciaram na semana passada que irão realizar um empréstimo de R$12 bilhões de reais, que será inevitavelmente compensado com ataques aos salários, benefícios e condições de trabalho dos funcionários dos Correios.
A alegação do presidente Lula de que seu governo é contra a privatização dos Correios é uma fraude. Na quinta-feira, ele declarou que, diante da crise financeira dos Correios, “Pode até ser economia mista, mas privatização, não.” Isso, por sua vez, faria com que os salários e as condições de trabalho dos funcionários fossem ainda mais determinados pela vontade de lucros dos acionistas, como já acontece na Petrobras.
O presidente brasileiro ainda explicou: “O que pode ter é construção de parcerias com empresas. Eu sei que tem empresas italianas querendo vir aqui e discutir com os Correios.”
Contra a perspectiva nacionalista e pró-corporativas dos sindicatos, construir comitês de base independentes!
Há anos, os trabalhadores dos Correios e da Petrobras têm enfrentado não só os ataques de sucessivos governos brasileiros, mas também as traições seguidas das duas federações sindicais em cada uma das categorias controladas pelo PT e seus satélites da pseudoesquerda.
As federações sindicais dos trabalhadores dos Correios e da Petrobras têm um histórico de semear a divisão dos trabalhadores dentro das próprias categorias e entre outras do funcionalismo público federal, além de desviar suas lutas para as várias instâncias do Estado capitalista. Com a volta de Lula ao poder, elas estão ainda apelando inutilmente para que seu governo resolva os impasses da greve, encobrindo os ataques que o próprio governo Lula está realizando aos trabalhadores dessas empresas.
Esse histórico se baseia na perspectiva nacionalista e pró-corporativas dessas federações sindicais. Enquanto as federações dos trabalhadores do Correios estão apelando para que “Lula salve os Correios” em nome da “soberania nacional”, estão defendendo um “plano de negócios sério” para que a empresa consiga competir com suas concorrentes internacionais no setor de entregas, o que aumentará ainda mais o grau de exploração dos funcionários.
Em entrevista à TVGGN na quinta-feira, Deyvid Bacelar, coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), filiada à CUT controlada pelo PT, avançou uma perspectiva não menos reacionária. Denunciando que a situação dos trabalhadores é “grave” depois de mais de três meses de negociações infrutíferas com a Petrobras, ele defendeu um fraudulento “princípio da independência e autonomia sindical diante dos governos e dos patrões”.
Bacelar, que é também dirigente nacional do PT, completou dizendo que, “dessa forma, inclusive, ajudamos o próprio companheiro, nosso querido presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a governar…nós precisamos pressioná-lo à esquerda”.
O governo Lula, no entanto, não pode ser “pressionado à esquerda” por seu claro caráter de classe: ele é um representante fiel de um setor do capital nacional e internacional tentando satisfazer seus interesses num mundo cada vez mais ameaçado pela guerra comercial e a agenda militarista por trás dela.
Na entrevista, Bacelar ainda disse que um dos eixos da greve é a concretização dos pontos elencados num documento intitulado “Pauta Brasil Soberano” publicado pela FUP em outubro deste ano. Nele, a FUP defende que a Petrobras deve garantir o “desenvolvimento da indústria nacional e a geração de mais e melhores empregos em nosso país” e avançar uma “transição energética justa”.
Este documento, por sua vez, está em consonância com linha nacionalista e pró-corporativa que o próprio governo Lula propôs em agosto quando lançou o “Plano Brasil Soberano” em resposta às tarifas abusivas de 50% que o governo do presidente americano Donald Trump tinha inicialmente imposto ao país. Com uma linha de crédito bilionária, o alegado objetivo desse plano é proteger as empresas e os empregos no Brasil em meio à guerra comercial de Trump.
O que os trabalhadores dos Correios e da Petrobras precisam nesta greve é de uma outra perspectiva política. Na perspectiva de quinta-feira sobre as demissões na indústria automotiva dos EUA, o World Socialist Web Site delineou os princípios dessa perspectiva, que também valem aos trabalhadores brasileiros em greve.
Segundo ela, tendo em visto o assalto global das elites dominantes aos empregos e condições de trabalho à medida que ela vira para a guerra e a ditadura, a luta deve ser internacional, rejeitando slogans nacionalistas como o “America First” de Trump e o “O Brasil é dos Brasileiros” de Lula, que servem “apenas aos interesses corporativos.”
Expondo a defesa que os sindicatos nos EUA fazem desse mesmo slogan, o que também pode ser dito dos sindicatos brasileiros, a perspectiva afirmou que essa luta também “deve estar indissoluvelmente ligada à luta contra a burocracia sindical.”
Isso só pode acontecer se forem formados comitês de base independentes dos sindicatos e controlados democraticamente pelos próprios trabalhadores para unir suas lutas com as de trabalhadores de outras categorias no Brasil e internacionalmente através da Aliança Operária Internacional de Comitês de Base (AOI-CB).
Não menos importante, desde 12 de dezembro, a luta da classe trabalhadora internacional ganhou um novo e poderoso instrumento para auxiliá-la: “Socialism AI”, um chatbot desenvolvido pelo WSWS que é baseado tanto nas obras históricas do marxismo quanto de décadas de cobertura do WSWS das lutas operárias no mundo, inclusive no Brasil.
Como declarou ontem um trabalhador dos Correios da Austrália, “Socialism AI” “oferece aos trabalhadores dos correios algo que os sindicatos e a administração nunca oferecerão: educação política clara e acessível, baseada na teoria marxista, combinada com orientações práticas para se organizarem”, servindo como “um guia para a construção e expansão da Aliança Operária Internacional de Comitês de Base”.
Fazemos um chamado aos trabalhadores brasileiros para criarem comitês de base, adotarem uma perspectiva internacionalista e usarem “Socialism AI” para se educarem, se organizarem e unirem suas lutas contra os ataques coordenados das administrações das empresas, dos governos capitalistas e dos sindicatos nacionalistas e pró-corporativos em todo o mundo. Acima de tudo, essa perspectiva deve se voltar a causa desses ataques, o sistema capitalista.
Leia mais
- ¡Por un movimiento global unido contra los despidos en la industria automovilística!
- Trabalhadores dos Correios aprovam indicativo de greve contra ataques do governo Lula
- Sindicatos encerram greve da educação federal no Brasil
- Após encerrar greve na Petrobras, sindicato aprova fechamento da Fafen e demissões
